Se você não é da construção civil, pode ter ouvido ou lido notícias relatando a ruína de estruturas sob efeito do vento e tempestades. Muitas vezes, até quem é da área pode não levar muito a sério o que a norma brasileira (ABNT NBR 6123:1988) recomenda sobre as ações dos ventos nas edificações. Na coluna de hoje, você poderá entender como consideramos os ventos em projeto e o quanto é importante confiar o projeto nas mãos de quem segue as normas e conhece os cálculos envolvidos.
A partir de dados de velocidades de ventos medidas por anemômetros estrategicamente espalhados pelo Brasil (em aeroportos, principalmente), é possível encontrar, a partir de estatísticas, a máxima velocidade que poderá ocorrer num período de 50 anos, para uma rajada de 3 segundos e numa altura média de 10 metros. A obtenção de tais dados nas diferentes regiões do país nos fornece o mapa de isopletas, disposto na ABNT NBR 6123:1988, que mostra as várias regiões de velocidades iguais no território brasileiro. Por exemplo, em Maringá-PR, temos uma velocidade básica (V0) de 45 metros por segundo, o que resulta 162 km/h. Talvez você pense: “mas essa velocidade é quase impossível de acontecer!”. Certo, porém é nesse “quase” que mora o perigo.
Figura 1 – Cobertura metálica desaba sob forte tempestade, em Pirenópolis (SP). Fonte: Interativa FM.
Obtida a velocidade básica V0, temos os fatores S1, S2 e S3: o primeiro, S1, é o fator topográfico, maior ou menor a 1,0, que considera o tipo de terreno onde será erguida a obra; S2 coordena a rugosidade do terreno e as dimensões da edificação, ou seja, insere a interferência de obstáculos na passagem dos ventos; já S3 determina uma margem de segurança se a edificação tiver função específica, como hospitais e quarteis (quando S3 é maior que 1), e reduz a influência do vento em outros tipos de construções (sendo S3 menor ou igual a 1).
Com essas informações, determina-se a velocidade característica (Vk), de maneira que esta possa servir como parâmetro para encontrar a pressão exercida pelo vento na estrutura. É claro que nem todos os pontos recebem a influência total dessa velocidade e, para comprovar o fato, foram testados diversos modelos reduzidos em túnel de vento (laboratório) a fim de saber como o vento se comporta numa edificação. Após pesquisas e estudos, estabeleceu-se na norma brasileira um conjunto de coeficientes cuja função é determinar o quanto da pressão total gerada por Vk é aplicada em cada local de nossas construções, para cada caso. Um exemplo simples de influência do vento seriam as placas de rodovia, com grandes dimensões, que devem ser dimensionadas para suportar fortes ventos.
Bom, se nós engenheiros civis sabemos como as tempestades podem acabar com o trabalho de meses e até por em risco a vida de muitas pessoas, por que continuam desabando muitas construções por aí?! O problema reside na falta de confiança de alguns engenheiros nas normativas vigentes, estabelecendo valores de velocidades de vento muito abaixo do que é recomendado para a região, quase sempre para economizar materiais, ou, ainda, porque preferem “contar com a sorte”.
Se existe a norma brasileira, já consagrada na prática, não há motivo para dispensá-la. Basta seguir os procedimentos e encontrar uma força que representa a ação dos ventos na estrutura. Assim, o projeto da sua obra deverá contemplar uma estrutura preparada para resistir a essa ação é calculada de modo minucioso, sem onerar em excesso o bolso do cliente, que ficará responsável pela compra dos materiais e contratação da mão de obra. Do contrário, se a estrutura vem a desabar sob fortes ventos, há várias causas: a primeira pode estar na execução, ou seja, os projetos não foram seguidos fielmente; no segundo caso, o engenheiro responsável pelo projeto é quem deverá assumir o problema, revisando seus cálculos para entender se não houve algum erro na consideração dos parâmetros; por fim, pode acontecer que a estrutura perca capacidade resistente ao longo do tempo e venha a ruir, principalmente quando não houve manutenção.
É de grande valia saber que se pode projetar e construir estruturas resistentes. Todavia, o assunto é extenso e ainda gera algumas polêmicas no Brasil, principalmente no mapa de velocidades (isopletas). O que nós podemos fazer como engenheiros é continuar seguindo as recomendações vigentes da ABNT NBR 6123:1988 e entendermos que, assim, podemos evitar prejuízos e riscos à vida das pessoas.
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