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Por Caio Henrique Lopes Ramiro
No último dia 3 de novembro muitos estudantes se submeteram ao ENEM. O exame nacional do ensino médio colocou como tema de sua redação o desafio do reconhecimento da herança africana no Brasil. Não há menor dúvida da relevância e da atualidade deste tema.
Neste sentido, como último texto da coluna deste ano, objetivamos render alguma homenagem ao arcebispo Desmond Tutu. Para iniciar, parecem interessantes algumas notas biográficas. Desmond Mpilo Tutu, nascido em 7 de outubro de 1931 em Klerksdorp, na África do Sul, foi arcebispo da igreja anglicana na Cidade do Cabo e defensor dos direitos humanos.
No ano de 1984 foi reconhecida sua luta contra o violento sistema do Apartheid, duro aparelho de segregação racial imposto à maioria da população da África do Sul. No contexto desta luta política o arcebispo conheceu outro importante líder sul-africano, a saber, Nelson Mandela. Desmond Tutu liderou e participou de inúmeros protestos contra o governo da África do Sul, em especial contra o regime de segregação, tendo, inclusive, sido nomeado para presidir a Comissão da Verdade que ficou incumbida do exame dos crimes praticados durante o Apartheid. Talvez esta seja a parte mais conhecida da biografia de Tutu. O arcebispo faleceu no dia 26 de dezembro de 2021, aos 90 anos de idade. Ora, é importante notar que sua morte ocorre um dia depois da data em que os cristãos relembram o nascimento de Jesus Cristo.
Por aqui, parece interessante lembrar do arcebispo Tutu, em especial de sua mensagem espiritual. Neste sentido, apresenta-se como algo seminal observar a forte amizade que Desmond Tutu estabeleceu com o líder budista Dalai Lama. Deste bom encontro surgiu um diálogo intercultural e religioso que nos legou um livro, a saber, Contentamento: o segredo para a felicidade plena e duradoura, bem como o documentário Missão: Alegria. O objetivo dos líderes espirituais é apresentar uma possibilidade de leitura da vida que encontra alegria e contentamento, apesar das adversidades.
Para Desmond Tutu o nosso maior contentamento é a busca por fazer o bem aos outros. O arcebispo afirma que somos algo programados para ser compassivos, desse modo, precisamos ativar o nosso circuito cerebral que se dedica à generosidade. Por este caminho, o arcebispo pretende afirmar que existe uma outra forma de viver, que recusa o ideário violento da competição e da concorrência e coloca no horizonte uma perspectiva que leva em consideração a hipótese de que nós dependemos uns dos outros para sermos quem somos. Para explicar este ponto Desmond Tutu se vale do conceito de Ubuntu, uma categoria conceitual da filosofia africana que diz, em sua leitura, que “uma pessoa só é uma pessoa através dos outros”.
Assim, Desmond Tutu opõe à ditadura de mercado da vida concorrencial a generosidade fundamentada na filosofia africana, pois “a filosofia Ubuntu diz que, quando tenho um pedacinho de pão, é benéfico para mim que eu o compartilhe com você”. Ao que parece não se trata de uma perspectiva egoísta do altruísmo, mas, isto sim, uma clara certeza de que “no final das contas nenhum de nós veio ao mundo sozinho”. Em tempos natalícios parece interessante refletir acerca dessa herança africana acerca da solidariedade, aceitando o convite do arcebispo Tutu à generosidade como outra forma de estar no mundo.
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