Desde sempre, varejistas promovem liquidações de seus produtos. A Amazon, que parece ter gostado da ideia, promove duas grandes liquidações no seu marketplace: O Prime Day, que este ano aconteceu nos dias 21 e 22 de junho, e a Black Friday que acontece na sexta-feira após o dia de Ações de Graças. Em ambas as ocasiões, os dispositivos echo tem reduções expressivas no preço ao consumidor, atiçando o bolso das pessoas aficionadas em tecnologia. Se os valores caem, o que sobe em todas as redes sociais é a incidência da pergunta: para o quê serve uma Alexa?
Antes de respondermos essa pergunta, especialmente para você que está tendo o seu primeiro contato com esse tipo de equipamento, vale a pena entendermos melhor o que é a ‘Alexa’.
A Alexa faz parte de um novo grupo de softwares chamados de “assistentes virtuais”. Este novo filão de tecnologia fez tanto sucesso que as big techs construíram suas próprias versões: A Apple possui a Siri, Microsoft a Cortana, Google o Google assistente e a Amazon a famosa Alexa. A interação com essas assistentes se dá por intermédio de gadgets especiais – como o Google Nest e os dispositivos echo, da Amazon – ou ainda por meio de aparelhos de uso comum, como celulares, tablets e notebooks.
No entanto, o sucesso desses equipamentos não dependem apenas da sua qualidade e características únicas. A popularização dos assistentes está diretamente ligada a capacidade de outros dispositivos se conectarem. O que vem acontecendo com crescente frequência. Hoje já é possível conectar as luzes da sua casa, a tranca da porta, o ar-condicionado, aparelho televisor e até mesmo a máquina de lavar e secar roupas já está integrada com os assistentes virtuais. E agora é o momento em que você me diz: Mas eu vou comprar esses aparelhos apenas para apagar a luz da sala?
Eu não era um humano totalmente consciente quando as TV de controle remoto se popularizaram no Brasil. Mas eu sou capaz de imaginar que fizeram a mesma pergunta quando elas surgiram. Este tipo de questionamento – para que serve – parece surgir de um estranhamento recorrente as novidades tecnológicas. A exemplo disso temos o desapreço de Charles Chaplin ao cinema falado; o movimento contra a guitarra elétrica, representado principalmente por Elis Regina; e tantas outras reações adversas a novidades tecnológicas, que renderiam uma longa – e cansativa – lista.
É curioso que coisas, tão comuns para nós hoje, no passado tenham levado a reações contrárias tão incisivas. A inovação parece criar esse estranhamento inicial e gozar de descrédito quase que imediatamente após o seu surgimento. Apenas com o passar dos anos, quando se perde o cheiro e o brilho da novidade, é que passam a ser melhor aceitas socialmente. O que acontece?
As diversas áreas do saber discutem o tema da naturalização. E mesmo apesar das diferentes abordagens ao tema, é possível dizer que há um consenso a respeito do que ela de fato é: um processo pelo qual um grupo estabelece um conjunto de símbolos culturais e os mesmos são aceitos sem questionamento.
Uma criança, por exemplo, até certa idade não questiona o idioma, as roupas, a religião e tantas outras características culturais que já estão dadas. Ela simplesmente as absorve pois já estão dadas na sociedade; já estavam lá quando ela chegou. Nós, por outro lado, temos o esforço de aceitar essa novidade e introduzi-la na nossa rotina já estabelecida, no nosso conjunto de signos e significados. Essa talvez seja a explicação do porquê algumas interfaces com o usuário, feitas diretamente para os mais jovens, pode representar pouco – ou nada – para outras faixas etárias da sociedade.
Uma inovação tecnológica, portanto, além de vencer as dificuldades do mercado, precisa construir os caminhos para sua naturalização. É possível inferir, desta feita, que a pergunta “para o quê serve a Alexa” – ou qualquer outro assistente virtual – surge em um extrato social que ainda não naturalizou essa novidade. O que não quer dizer que as pessoas que compraram seus dispositivos já tenham naturalizado seu uso. Além da naturalização, o mercado também conta com o fetiche atrelado à posse do produto; a disposição dos curiosos que curtem a “novidade pela novidade”. Mas esses são debates para outro momento.
Ainda assim a pergunta resiste: para que serve a Alexa? Diante da discussão que tivemos até agora, é possível dizer que a resposta está na própria pergunta: A aquisição de um assistente virtual serve para a sua própria naturalização na sociedade. E uma vez que essa tecnologia esteja naturalizada, abre-se o espaço para outras inovações. A pergunta deixa de ser “para o quê serve” e passa para “como essa tecnologia pode me ajudar”, abrindo espaço para novas tecnologias que acrescentem sentido à inovação.
Para concluir, não posso deixar de dizer que esse recorte possui um viés econômico na relação com as coisas. Na pirâmide de prioridades de Maslow, um produto cuja utilidade é socialmente questionável, encontra-se quase no topo. O fato de apenas uma pequena parcela da sociedade poder se dar o luxo de empenhar os valores pedidos por tais tecnologias, levanta questões sobre o acesso à tecnologia. Todavia este também é assunto para outro momento.
Por fim, caso não consiga resistir a tentação de adquirir essas pequenas caixinhas mágicas, que tornam o lar um espaço ainda mais interativo, não se culpe (eu mesmo tenho duas). E seja bem-vindo ao privilegiado mundo das inovações tecnológicas!
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