O debate sobre gênero nas escolas e o combate à ideologia da “alienação sexual”

Por: - 9 de setembro de 2021

 

“Milhares de pessoas, todos os dias e em todo mundo, morrem apenas por serem quem são; a falta de educação sobre gênero é o gatilho que dispara contra essas vidas”

 

RANDY FUSIEGER

 

A sociedade avança a passos lentos para identificar e respeitar alguns cenários condizentes ao ser social. Engana-se quem pensa, porém, que o debate sobre gênero e sexualidade como forma de identificação e reconhecimento do ser humano frente à sociedade começou agora, ou ainda, “que é coisa dessa gente que não sabe o que quer”: buscando um pouco na história e olhando o passado, a dinamarquesa Lili Elbe é considerada a primeira mulher transexual a realizar a cirurgia de redesignação sexual, lá na década de 1920. Hoje, no entanto, o debate está ainda mais evidente, mas longe de ser esclarecedor para uma grande parcela da sociedade.

Dei início à minha caminhada na pesquisa e no debate sobre gênero e sexualidade após ter a oportunidade de entender e conhecer os direitos que nossa comunidade conquistou e mais, que ainda precisamos conquistar. Depois disso, costumo dizer que consigo reduzir todo o meu discurso em quatro palavras: pessoas morrem por isso. Partindo desse pressuposto, nós precisamos elencar numerosos pontos que situam as pessoas sedentas ou inquietas para conhecer e respeitar essa comunidade. O primeiro deles é fazer que as pessoas entendam que o debate sobre gênero nas escolas nunca teve, não tem e tampouco terá o intuito de “transformar crianças” e ainda mais: ditarem o que elas serão (ou não) em relação à sexualidade que foi orientada para cada um(a). Não é do interesse de nenhum pesquisador, professor, palestrante, debatedor ou militante trabalhar com algo que causa repulsa em cada um destes: a alienação. O que se procura trabalhar dentro das escolas é o que também se trabalha fora dela: o respeito e a consciência diante da comunidade LGBT, sobretudo as pessoas que não se identificam com o corpo biológico que habitam. Não é uma questão de escolha, é uma questão de segurança. E como eu já disse em um outro texto meu por aqui: “O silêncio, em casos de abuso, só é do interesse do abusador.” 

Os grupos contrários e que defendem a “ideologia de gênero” – algo que, evidentemente, não é ideológico, mas identitário – alegam que o estudo sobre gênero nas escolas é alienador, imperativo e pretende, entre tantos outros “absurdos”, distribuir o “kit gay” para cada aluno aprender a ser um. Vou trabalhar com informações: à luz do dia 15 de fevereiro de 2017, a travesti Dandara dos Santos, de 42 anos, foi espancada, apedrejada, arrastada por vários metros pelas ruas do bairro Bom Jardim, em Fortaleza (CE) e finalmente morta por um grupo de, pelo menos, 8 agressores. Tudo isso assistido pela população local e filmado, com um vídeo de aproximadamente um minuto e meio. Porém, não precisamos ir muito longe: um adolescente de 14 anos foi agredido no ponto de ônibus em frente ao colégio que estuda, em Maringá, por dois rapazes: um era aluno do mesmo colégio. Outro, maior de idade. O adolescente agredido teve o rosto desfigurado e passou por uma reconstrução facial no Hospital Universitário (HU). Tais casos só ilustram o quão é urgente, necessário e racional educar cedo para não punir mais tarde. Deve-se, acima de tudo, trabalhar os meios para que a educação aconteça e não somente os fins, com punição exacerbada e o aumento substancial da violência contra pessoas LGBT.

O Brasil é o país que mais mata pessoas da comunidade LGBT. É, também, o país mais transfóbico do mundo. Ano passado, 175 pessoas trans foram mortas no Brasil, um número que aumentou, pois segundo dados divulgados pela ONG Transgender Europe, só em 2016, 123 pessoas trans foram mortas no país. Não devemos esquecer, claro, que estes crimes foram computados considerando o parecer de crime de homofobia pela polícia e órgãos responsáveis. Se trabalharmos com as ocorrências que são crimes de homofobia, mas não são catalogadas como tal, esse número é assustadoramente maior.

Nós precisamos resistir. E essa resistência precisa ser firme, inclusiva e esclarecedora para que um dia, os números de agressão e morte diminuam. Nunca foi cobrado que pessoas da comunidade LGBT recebessem tapetes vermelhos para caminhar, o que se cobra é que o sangue das pessoas dessa comunidade não vire tapete para a intolerância, o ódio e a violência contra quem morre apenas por ser quem é

Cartaz levantado durante a 5ª Parada LGBTQ de Maringá (Imagem/Randy Fusieger)

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