Maringá já teve um auge do setor de shoppings atacadistas, quando haviam seis deles instalados na cidade. Após momentos de crise, em especial a partir de 2013, apenas três sobreviveram – Paraná Moda Park (antigo Pérola Park), Avenida Fashion e VestSul.
Enquanto os dois primeiros estão retomando seu espaço, o VestSul passa por dificuldades e tem mais de 20% de suas lojas fechadas.
A história desses empreendimentos compõe a própria estrutura urbana da cidade. Segundo João Ricardo Tonim, diretor geral do Codem (Conselho de Desenvolvimento Econômico de Maringá), o período entre 1993 e 2013 consolidou o setor de vestuário como um dos maiores centros do país para distribuição, que chegou a ter seis shoppings atacadistas.
Com a crise econômica e as mudanças de custeio e impostos, essa representatividade teve uma queda a partir de 2013, sendo uma adaptação necessária à nova situação do mercado.
Diante dessa relevância, o Maringá Post buscou informações sobre os aspectos que contam essa história, quais as ações já tomadas para o enfrentamento da crise e quais os próximos passos para um futuro de retomada.
O mais antigo tem problemas
O VestSul foi o primeiro shopping atacadista de Maringá, por iniciativa de um grupo de empresários. Desde 1995 o empreendimento está na sede atual: tem 26.500 metros quadrados de área, um auditório para 250 pessoas e pousada com 108 leitos.
O espaço tem um perfil muito diferente dos outros, com lojas de poucos atendentes e de perfil, de forma geral, mais velho, sendo muitos deles familiares dos próprios proprietários.
Um dos pontos negativos a esclarecer é o grande número de lojas fechadas. Dos pouco mais de 250 espaços disponíveis, 55 estão estão fechados. O movimento é notavelmente menor, comparado, no mesmo horário, ao do Avenida Fashion, shopping ao lado.
Muitas lojas estão adesivadas com anúncio de que serão abertos novos empreendimentos em breve, mas sem identificação do nome da próxima loja e quando será aberta.
Além disso, muitos outros espaços estão abertos com a exposição de manequins e peças de outras lojas, como forma de “publicidade”, e recurso para que a aparência não exponha tantos espaços vazios.
A prática foi comentada por vários lojistas e é tida como frequente, porém a administração do VestSul não retornou os contatos da reportagem para prestar esclarecimentos.
Os atuais administradores Octávio Baroni Junior e Alexandre Vivan, do Paraná Park e Avenida Fashion, respectivamente, já trabalharam no VestSul.
Um ponto em comum apontado por ambos diz respeito à estrutura administrativa do shopping, que tem mais de 70 proprietários e uma associação, o que, segundo eles, dificultam a dinâmica na tomada de decisões.
Para Vivan, sendo a administração descentralizada e dividida com os próprios lojistas, há um “inconsciente egoísmo” que ultrapassa as necessidades do coletivo.
Segundo ele, “não há espaço para decisões que possam afetar o interesse próprio e, assim, prejudica administração como um todo, com um apego pessoal”.
Sobre a tomada de decisões, Baroni Junior diz que, por ser demorada e muito burocrática, há sempre um tempo perdido em relação à concorrência, que não pode ser alcançada com facilidade.
“Esse mesmo processo – acrescenta -, acontece para a reposição de lojas, que não tem direcionamento dinâmico”.
De forma geral, há uma impressão de que o VestSul não acompanha as mudanças necessárias no setor e não se atualizou para um novo meio de mercado, que ao contrário dos outros shoppings, não aparenta estar pronto para uma retomada.
O maior dos três é de 2004
O Avenida Fashion foi inaugurado em julho de 2004, tem 34.000 m² e está localizado na Rodovia PR-317, nº 5.693, próximo ao aeroporto de Maringá.
Tem como estrutura de apoio uma pousada para 190 pessoas. Conta com 175 CNPJs registrados de lojas e, atualmente, 15 espaços estão fechados (8,5%).
A estrutura é mais simples do que a do Paraná Moda Park, porém conta com movimento intenso e contínuo nas lojas, que são acolhedoras.
Os vendedores também aparentam manter um relacionamento mais rotineiro entre com os compradores. É considerado, até mesmo por lojistas de outros shoppings, como um “termômetro” de vendas do polo.
Alexandre Vivan, 48, administrador do Avenida Fashion desde as fases iniciais do projeto, diz que a abertura de concorrência com a China e o dólar baixo foram fatores que, junto ao momento de crise do país, afetaram o setor.
“O mercado atacadista de confecções não estava preparado para uma mudança tão rápida em meio a empolgação dos anos anteriores”, observa Vivan.
Segundo ele, a administração mais firme, por mais que não tenha feito grandes mudanças, soube se adequar ao momento de queda e, com isso, sobreviver.
“Foi preciso, por exemplo, diminuir os ganhos por um período, que agora voltam a crescer”, conta o administrador.
O principal ponto de segurança, acredita Vivan, foi manter um relacionamento de confiança com o comprador. Para isso, foi preciso abrir o mix de lojas, mesmo para àquelas com menor potencial de vendas.
Ele considera que o número de lojas fechadas (15) é pequeno e que faz parte da rotina de rotatividade de um comércio do porte do Avenida Fashion.
Outro fator importante nessa retomada, destaca, é o relacionamento com consumidores que vêm de outras cidades, que também acabam dando força a outros setores da economia local de forma indireta.
Vivan conta que ouve relatos sobre pessoas que alongaram a estadia para tratamento médico, ir ao cinema, ao teatro, restaurantes e mesmo para conhecer lojas de grandes franquias, que não existem em municípios de pequeno porte.
Pérola Park virou Paraná Moda Park
O antigo Pérola Park, foi reinaugurado em 2016 sob nova direção, e mudou o nome para Paraná Moda Park.
Possui uma estrutura com 23 mil metros quadrados de área, disposta de forma semelhante a um shopping de varejo. Tem 123 lojas locadas e uma pousada anexa, com capacidade para alojar 208 pessoas.
O administrador, Octávio Baroni Junior, que assumiu em 2016, vindo do VestSul, conta que o setor teve um boom entre 2012 e 2015 e que caiu muito bruscamente em 2016, “o pior ano da década”.
Contudo, diz ele, a recuperação vem acontecendo neste ano. “Muito disso se deve à reinvenção administrativa, que desde a reinauguração tem investido forte nas áreas comercial, de mídia e também estrutura, para atrair e fidelizar os clientes”.
Ele confirmou as informações colhidas nos corredores dos shoppings, segundo as quais houve incentivos muito agressivos para atrair lojistas. “Foi sim feita uma revisão das taxas de aluguel para se adaptar ao mercado e criar um ambiente sustentável”, revela.
Na visão de Baroni Jr “o comprador se encantar é fundamental. Foi então criando um ambiente acolhedor, imponente, com opções variadas e que integre todas as necessidades”.
Nesse sentido, acrescenta, houve um trabalho intenso no último ano para preencher todas as lojas com variedade, não deixando o espaço ocioso.
Também, estão sendo feitos investimentos para a continuidade do plano do complexo, com uma torre de hotel e um centro de eventos, além de espaço para salas comerciais.
A história e dados do setor
O começo do setor atacadista de confecções em Maringá foi em 1990, ainda num pavilhão do Parque de Exposições Francisco Feio Ribeiro, quando foi instalada uma galeria com 46 industrias-lojistas, que acabou dando origem ao Shopping VestSul.
A galeria nasceu de uma parceria entre a Sociedade Rural de Maringá e a prefeitura, que buscava atender a uma demanda dos consumidores por otimizar as compras num único local, de forma segura, cômoda e econômica.
Diante do crescimento do setor, em 1993 foi inaugurado o Shopping Mercosul, na rodovia PR-317, km 1. O local foi escolhido porque havia a informação sobre as futuras instalações do Shopping VestSul no km 6.
Até o final daquela década foram inaugurados também o Shopping Caiuá e o Catarinão. Em 1998, a inauguração do Moda Paraná foi um grande evento na cidade e contou com presenças famosas, como Adriane Galisteu, Clodovil e Elke Maravilha.
Luis Fernando Ferraz, diretor da BandFashion (antiga Confecções Bandeirantes) e presidente do Sindicato do Vestuário entre 2001 e 2003, conta que o pioneirismo do VestSul, do qual fez parte ainda enquanto galeria, “foi primordial para o fortalecimento dos shoppings atacadistas e tornar Maringá uma referência da pronta-entrega nacional”.
Para Ferraz, as fases de crise representam um desequilíbrio entre a oferta e a demanda do setor, nas quais os empresários devem se manter cautelosos e se adaptar ao mercado e suas tecnologias.
“Roupas são um bem indispensável, apesar do momento econômico, e o grande diferencial de competição deve ser a qualidade, pois todo mundo quer se vestir bem”, diz.
De acordo com informações do Sindvest (Sindicato da Indústria do Vestuário de Maringá) são produzidas cerca de oito milhões de peças por mês na cidade, que movimentam aproximadamente R$ 2 bilhões por ano, em média.
Contudo, vários números tiveram queda em 2016 como reflexo da crise econômica. O número de indústrias da região sofreu uma queda de 26% em relação a 2015, enquanto o número de empregos (diretos e indiretos) caiu 30% no mesmo período, ainda que mantenha um número significados de 56 mil empregos.
De acordo com o Codem, por mais que o setor tenha sido afetado pela crise, continua relevante na geração de emprego e renda, e está buscando novas ferramentas para ampliar seu mercado, como a exportação e a entrada no e-commerce, que reduz os custos operacionais e amplia a competitividade.
Como funciona o mercado atacadista
Como shopping de atacado, a estrutura de comércio é um pouco diferente de num centro de varejo, pois se destina, na grande maioria, a lojistas que farão a revenda.
Por isso, as lojas são mais segmentadas por tipo de produto e atingem um volume maior por venda, Também oferecem um preço menor e funcionam como escala entre a produção e o consumidor final.
Um dos principais responsáveis por essa relação entre o revendedor do varejo e o lojista do atacado são os agentes de moda, também conhecido como guias.
O guia é quem faz a ponte com clientes de outras cidades, que vêm para comprar nos shoppings de atacado.
São eles que organizam excursões coletivas ou ajudam no planejamento das viagens de quem prefere vir sozinho.
Quando o cliente chega, os guias também ajudam no direcionamento das lojas que se adequam ao perfil de quem vai comprar e entre outras funções que compõem esse relacionamento.
Julio Machado Junior é guia desde os 17 anos. Trabalha na agência da família e, recentemente, abriu uma loja de moda infantil.
Baseado nessa experiência de doze anos, ele conta que a confiança é um fator indispensável na profissão, tanto com o cliente que vem ao shopping quanto com o lojista.
A principal responsabilidade é a garantia da compra, sendo o limite de crédito de cada comprador aprovado de forma integrada entre os três shoppings, mediante participação do guia.
Para cada venda realizada, 12% do valor são destinados para a administração central, sendo que 10% são repassados ao guia e 2% são para manutenção.
O importante desse rateio, no entanto, é que em caso de inadimplência do comprador, a dívida é descontada da comissão do guia ao fim do acerto.
“Se vendo R$ 1 mil e o cliente paga, ganho R$ 100. Mas se ele não paga, então quem paga os R$ 1 mil sou eu”, explica Julio.
Pelo ponto de vista dele, a situação de cada um dos centros atacadistas é muito particular. O Paraná Park, para ele, apresenta o melhor potencial na situação atual, dada uma guinada promovida pela nova administração, que tem investido no empreendimento.
O Avenida Fashion é mais estruturado e estabelecido – observa Junior – e lidou bem com a crise. Isso é um ponto de segurança e estabilidade desde o começo.
Apesar desse viés otimista para o polo, o VestSul, segundo o guia, não tem conseguido se adequar ao que o momento pede e enfrenta mais dificuldades.
O futuro passa por adaptações
Os relatos ouvidos pela reportagem junto a lojistas, clientes e lideranças do setor indicam que, apesar dos efeitos da crise econômica e a ampliação de concorrência na moda, há caminhos de inovação administrativas e mudanças tecnológicas que fortalecem as empresas, que podem se adaptar e aproveitar as novas oportunidades do mercado.
Tonim, diretor do Codem, afirma que essas alterações levam a um caminho capaz de criar impactos significativos para Maringá, onde uma série de projetos, ações e estudos transformam a cidade para o futuro.
Esses projetos, acrescenta, facilitam a tomada de decisão de empresários, gestores públicos e da sociedade civil para uma Maringá melhor, mais moderna e fiel ao próprio passado.
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