Maringá: Sem licitação, contratação de R$ 4,7 milhões da Educação vai parar no Ministério Público

Uma representação formal entregue pela vereadora Professora Ana Lúcia (PDT) à 1ª Promotoria de Justiça pede a instauração de um Inquérito para apurar a compra do ‘Método IntraAct’, que promete ensinar crianças a ler em 4 meses. Parlamentar questiona possível inexistência de validação científica e incompatibilidade da metodologia com o Plano Municipal de Educação.

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    O Ministério Público do Paraná (MP-PR) recebeu nesta sexta-feira (25) uma representação que pede a instauração de um Inquérito Civil, visando investigar uma contratação, sem licitação, de R$ 4,7 milhões firmada pela Secretaria Municipal de Educação (Seduc) de Maringá. Trata-se de um contrato para a implantação do ‘Método IntraAct’, metodologia alemã que promete ensinar crianças a ler em 4 meses, por meio de um processo de repetição de sons e palavras.

    A representação foi formulada pelo gabinete da vereadora Professora Ana Lúcia (PDT) e entregue à 1ª Promotoria de Justiça. O contrato entre o município e uma empresa de Brasília, que será responsável pelo material didático e treinamento dos professores, foi firmado no dia 17 de abril, segundo consta no Portal da Transparência.

    Na representação, a vereadora questiona a possível inexistência de validação científica da metodologia contratada, além da incompatibilidade com o currículo da rede municipal de ensino e as diretrizes firmadas no Plano Municipal de Educação (PME).

    Segundo o documento entregue ao MP, o Método IntraAct “não encontra respaldo no Plano Municipal de Educação de Maringá (Lei nº 10.024/2015)”. Ainda conforme a representação, “a ausência de alinhamento com as metas e estratégias do PME compromete a legitimidade e a legalidade da política educacional implantada, além de violar os princípios da continuidade e da coerência institucional na gestão pública”.

    Ana Lúcia cita que a contratação sem licitação, de uma única metodologia “de origem privada, com
    aplicação compulsória em toda a rede municipal, contraria frontalmente o princípio da pluralidade metodológica consagrado no PME”. A representação também cita que a metodologia “não integra qualquer programa pedagógico do Ministério da Educação”.

    Ainda no documento, o gabinete da parlamentar também questiona o fato da contratação ter ocorrido sem processo licitatório. A vereadora sugere, além da instauração do Inquérito, que o Ministério Público solicite à Prefeitura de Maringá a apresentação de documentos que justifiquem a necessidade da dispensa de licitação e argumentos técnicos que respaldem a escolha do Método IntraAct. O MP ainda não se manifestou sobre o caso.

    Meta de deixar alunos fluentes em leitura até o fim do ano

    Em entrevista ao Maringá Post na quinta-feira (24), o secretário de Educação de Maringá, Fernando Brambilla, falou sobre a contratação. Segundo ele, a metodologia foi escolhida após uma análise de técnicos do município que incluiu visitas presenciais a cidades que testaram o IntraAct e ‘tiveram bons resultados’.

    Segundo o secretário, apenas 25% das crianças do 1º e 2º ano do fundamental na rede municipal são consideradas leitoras fluentes. A meta é contornar a situação até o fim do ano.

    “Nós tivemos, a prova feita pela Secretaria Estadual de Educação, que avalia a fluência leitora das crianças. Nós temos um pacto com o Governo Federal, que é o Compromisso Nacional da Criança Alfabetizada, onde se deveria, no final do segundo ano, todas as crianças saber ler, escrever e ter uma compreensão textual. Porém, em Maringá, apenas 25% das crianças tem a fluência leitora. Então, nós tivemos essa informação, esse resultado que nos preocupou. E a nossa contratação do IntraAct é para que a gente possa fazer uma recomposição, uma recuperação dessa aprendizagem, dessa alfabetização. […] Nossa equipe entrou em contato, fizemos algumas visitas em alguns municípios que utilizaram a metodologia Interact, para a gente ver realmente quais foram os resultados reais que eles escolheram. E os resultados foram muito bons. Nós tivemos municípios que com quatro meses já tiveram bons índices, e municípios com mais seis ou oito meses também tiveram alto rendimento”, justificou.

    Na justificativa da contratação, a Prefeitura de Maringá cita ‘cases’ de sucesso do método em algumas cidades que já utilizaram o IntraAct anteriormente, como Joaçaba/SC e Alta Floresta/MT. No caso do município matogrossense, a própria cidade afirma ter alcançado um índice de 83% de alfabetização de crianças nesta faixa etária. O percentual, no entanto, não é chancelado por nenhum indicador do Ministério da Educação (MEC).

    Pelo contrato, a empresa fornecerá livros para 7.555 alunos da rede municipal dos 1º e 2º anos do fundamental, divididos em 309 turmas. O valor engloba ainda o treinamento online de 360 professores. Os treinamentos deverão ter início em um prazo de 20 dias.

    Em sua página na internet, o IntraAct Brasil afirma que, com o método, “80% dos alunos aprendem a ler em 4 a 5 meses com até 1 hora de ensino diário”. Em 1 ano, “80% das crianças estão alfabetizadas”.

    O secretário de Educação de Maringá reconheceu que a metodologia não está cadastrada para avaliação do MEC. Em contato com a reportagem, o Ministério da Educação também confirmou que não tem informações sobre experiências piloto para adoção do IntraAct, mas ponderou que o órgão “não realiza a imposição” de nenhuma metodologia de ensino em específico.

    O Maringá Post entrou em contato com a Prefeitura de Maringá para comentar sobre a representação entregue no Ministério Público e aguarda um retorno.

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