Brasil e Vietnã fecham acordo de cooperação em blockchain

A ministra Luciana Santos classificou o pacto como um mergulho profundo na transformação digital compartilhada.

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    Às vésperas da 17ª Cúpula dos BRICS no Rio de Janeiro, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) confirmou a assinatura de um memorando com o Ministério homólogo do Vietnã para fomentar projetos conjuntos em blockchain, semicondutores, inteligência artificial e outras tecnologias habilitadoras.

    A ministra Luciana Santos classificou o pacto como um mergulho profundo na transformação digital compartilhada, relatando o potencial de inclusão financeira e de inovação industrial que a parceria traz para ambos os países.

    Ainda que o comércio bilateral Brasil‑Vietnã some pouco mais de US$ 7 bilhões anuais, o timing do acordo reflete uma lógica geopolítica maior. Desde que o Vietnã ganhou o status de país-parceiro no bloco em junho, Brasília passou a indicar o Sudeste Asiático como corredor prioritário para a exportação de serviços digitais brasileiros.

    Do lado interno, a movimentação coincide com um ambiente doméstico favorável, o Banco Central finalizou a primeira fase do piloto Drex, que já reuniu 16 consórcios e mais de quinhentas transações simuladas em contratos inteligentes, segundo relatório divulgado em fevereiro.

    Brasil e Vietnã: Do BRICS à cadeia de blocos

    O memorando firmado no Palácio do Itamaraty estabelece três eixos importantes, a pesquisa acadêmica, o intercâmbio de especialistas e as missões empresariais focadas em soluções de infraestrutura digital. Entre os casos de uso apontados pelos negociadores está a rastreabilidade de cadeias produtivas via blockchain.

    Recurso esse que ganhou visibilidade no Brasil com plataformas como a bConnect, do BNDES, e que interessa ao Vietnã para monitorar exportações de café e frutos do mar. Com essas aplicações práticas, a popularização de experiências gamificadas em NFTs também aparece no radar das duas nações.

    No Brasil, por exemplo, o conceito de mystery box barata tem atraído usuários que veem nas caixas misteriosas uma porta de entrada de baixo custo para o mercado Web 3, estimulando o engajamento do público jovem em ativos tokenizados sem comprometer grandes somas de capital.

    A expectativa de reguladores é que iniciativas lúdicas assim sejam incubadoras de padrões de segurança e transparência exigidos pela nova parceria. Segundo dados compilados pela Binance e pela consultoria Sentiment em março, 95% dos investidores latino‑americanos pretendem aumentar sua exposição a criptoativos até o fim de 2025.

    Um termômetro de demanda que reforça a relevância do acordo Brasil‑Vietnã. Em linha semelhante, o levantamento da Receita Federal indica que o número de brasileiros que declararam operações com criptomoedas já passa dos 12 milhões de contribuintes.

    Fator que torna urgente a cooperação internacional em padronização e compliance. A capitalização desse interesse popular já começa a se refletir na infraestrutura física. O país contabiliza nove caixas eletrônicos de Bitcoin espalhados de São Paulo a Petrópolis, quase o dobro de 2023, mostrando que a demanda não se limita às capitais financeiras.

    Para o MCTI, essa expansão de “touch points” é um indicativo de maturidade que facilitará futuros pilotos Brasil‑Vietnã em pagamentos instantâneos transfronteiriços, tema que o Banco Central brasileiro, com a segunda fase do Drex, já pretende testar.

    Ao abrir o mercado para parcerias em semicondutores, o governo brasileiro concilia o MdE com o programa Nova Indústria Brasil, que destina R$ 58,7 bilhões públicos e R$ 85 bilhões privados à transformação digital até 2026, incluindo incentivos diretos à cadeia de chips.

    Do lado vietnamita, a experiência com contratos inteligentes em portos de Hải Phòng servirá de laboratório inverso. Empresas brasileiras poderão aplicar a mesma lógica para escoamento de grãos pelos corredores Norte‑Sul, tema caro ao agronegócio e à pauta de sustentabilidade que o Itamaraty empenha nos fóruns do BRICS.

    Como o MdE impacta o ecossistema brasileiro

    Poucos dias depois de o Brasil anunciar R$ 58,7 bilhões em investimentos públicos na transformação digital da indústria, dentro da política Nova Indústria Brasil, e de reservar outros R$ 85 bilhões da iniciativa privada para semicondutores, computação em nuvem e robótica até 2026, o memorando com o Vietnã ganhou caráter ainda mais estratégico.

    A cooperação internacional reforça a missão dual que é, simultaneamente, criar novos mercados para tecnologia nacional e acelerar a adoção de padrões globais de governança digital. No setor agrícola, a convergência entre blockchain, IoT e IA já encontra solo fértil.

    A Embrapa Agricultura Digital mantém o Sibraar, sistema de agrorrastreabilidade que usa registros distribuídos para acompanhar cada lote de soja ou frutas desde a fazenda até o embarque em Paranaguá.

    O módulo piloto validou 12 mil eventos de transporte em 2024, reduzindo em 18% o retrabalho documental segundo métricas divulgadas pela estatal de pesquisa agropecuária. Essa infraestrutura conversa diretamente com o know‑how vietnamita nas rotas do porto de Hải Phòng. Quando integradas via MdE, as duas pontas formam um corredor logístico quase sem papel, ampliando a competitividade do agronegócio. A cadeia de exportação ganha ainda mais robustez com o bConnect, plataforma da Receita Federal baseada em Hyperledger Fabric que já troca dados aduaneiros com Argentina, Paraguai e Uruguai.

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