Agente da área de Segurança Pública há mais de 20 anos, parlamentar considera o tráfico de drogas como um elemento que dificulta a tarefa: “A Polícia pode prender, mas não pode tratar a dependência química”.
Por Victor Ramalho
Tema que volta e meia retorna ao debate público, o aumento na população em situação de rua em Maringá segue no centro das discussões em 2023. Se nas estatísticas oficiais faltam dados de quantas pessoas vivem nas ruas da Cidade Canção atualmente – uma vez que o poder público só pode contabilizar aqueles que aceitam acolhimento na rede de assistência social -, no dia a dia a impressão das pessoas é que esse número aumenta cada vez mais.
Debater soluções é uma tarefa complexa, por envolver vários eixos temáticos. São Paulo, a maior metrópole do país, por exemplo, tenta há quase décadas combater o problema da ‘cracolândia‘, sem sucesso. Um desses eixos é, justamente, o da Segurança Pública, local em que Delegado Luiz Alves (Republicanos) acumula vasta experiência, após ter integrado a Polícia Civil de três Estados diferentes ao longo da carreira.
Após alguns anos de trabalho de campo nas ruas de Maringá, o delegado viu de perto toda esse universo. Na visão dele, o tráfico de drogas é, ainda, um dos principais problemas que impedem o poder público de conseguir tirar essas pessoas das ruas.
“É inegável observar isso no dia a dia. A droga está ali presente e circula livremente. Não há como apontar uma única causa para que essas pessoas se tornem usuárias, nem podemos generalizar que todos que estão ali são usuários de drogas, mas essa é uma realidade. Como agente de Segurança, fazemos o que é de competência nossa: se há crime, se há uso de substâncias ilícitas, roubos e afins, nós vamos atrás, prendemos, combatemos. Mas sabemos que é uma questão muito complexa. Resolver apenas pela ótica da Segurança seria como seguir constantemente enxugando gelo”, afirma.
E encontrar outras soluções para um problema latente foi justamente um dos motivos que levaram Luiz Cláudio Alves a entrar para a vida pública. Nas eleições de 2020, foi candidato a um cargo eletivo pela primeira vez, tendo sido eleito vereador pelo Republicanos com 2 mil votos recebidos. De acordo com ele, a experiência como legislador o coloca em contato com outras visões de mundo.
“A Segurança Pública é uma bandeira minha, de fato, por conta de toda a minha experiência profissional. Creio que todo o período em que estou na Polícia Civil e, mais especificamente, em Maringá, me credenciam a poder falar do tema, sugerir soluções dentro do que está ao meu alcance. No entanto, legislar nos coloca em contato com outros eixos, outros problemas e, consequentemente, outras possíveis soluções. Sempre tive a consciência de que população de rua e usuários de drogas eram questões que não poderiam ser solucionadas apenas pela ótica da Segurança. Hoje, como vereador, consigo ter isso ainda mais claro, propondo medidas e políticas públicas que visem tratar essa questão desde o início”, relata.
Delegado Luiz Alves é o convidado desta semana da Série de Entrevistas do Maringá Post com os vereadores de Maringá. Além de questões relacionadas com a Segurança Pública, o vereador, que também é delegado de Polícia Civil, falou sobre a vida pública, os projetos que mais se orgulha e os planos futuros. Confira outros trechos da entrevista abaixo:
- Para que os eleitores possam te conhecer: O que motivou o senhor a se candidatar a vereador pela primeira vez, em 2020?
R: “Acreditava que eu tinha muito a contribuir com a vida pública por conta da minha experiência como delegado. Atuei na Segurança Pública aqui no Paraná e também no Rio de Janeiro, onde iniciei a carreira, além de uma experiência no Mato Grosso do Sul. Nos três estados, vi coisas que me inquietaram, afinal, é muito raro um agente de segurança hoje em dia que não se sinta indignado com o que ocorre no Brasil. A questão da criminalidade, do tráfico, são coisas que nos revoltam, mas que a solução não está só no “chão de fábrica”, do Delegado prender o indivíduo, ele ser solto e voltar pra criminalidade. A solução passa por políticas públicas e é, nessas políticas, que tenho tentado trabalhar desde que fui eleito”.
- Já passando da metade do primeiro mandato, que avaliação faz do próprio trabalho? Tem algum projeto que você se orgulha mais de ter proposto/aprovado?
R: “Felizmente, acredito que a experiência tem sido muito positiva. Projetos é difícil apontar um único em específico, já que propomos bastante coisa diariamente, não só em questão de projetos de lei, mas também na própria natureza fiscalizatória, com requerimentos e afins. Tem um projeto em especial que me toca, que não tem relação com a Segurança Pública: é de nossa autoria uma lei que determina que para as próximas construções de praças públicas que tenham parquinhos/playgrounds, ao menos 20% dos brinquedos tenham acessibilidade para portadores de necessidades especiais. É uma forma de manter a inclusão, uma bandeira que eu também tenho muito carinho e respeito. No dia a dia, estamos sempre atuando em defesa não só da Segurança, mas da cidade de uma forma geral. Acredito que a qualidade do trabalho de um vereador não deva ser medida por quantos projetos ele apresenta, mas sim pela forma que o trabalho desenvolvido consegue mudar a vida das pessoas”.
- Tem algo que o senhor gostaria de ter feito enquanto vereador e ainda não teve a oportunidade? Ou alguma pauta que tentou colocar em discussão e, por algum motivo, não caminhou?
R: “Essa é uma questão bem interessante. Legalmente, a atuação do vereador já é bastante limitada, até porque não cabe a nós a Execução dos projetos que nós mesmos elaboramos. A Execução é do Executivo, da Prefeitura. Eu mesmo gosto de pensar de um horizonte mais amplo, não pensando apenas no contexto da cidade. Acredito que todas as esferas de poder devem trabalhar juntas, unidas, para que as coisas avancem. Um exemplo prático, como já citei anteriormente, é a questão da população em situação de rua. A Polícia sozinha não tem condições de combater esse problema na raiz, assim como a Câmara sozinha também não consegue. É uma união de forças até mesmo dentro do próprio Executivo. Não basta só Segurança Pública, tem que envolver Segurança Pública, Educação, Assistência Social, Saúde e muitas outras áreas. Essa era uma questão que eu gostaria muito de ter visto mais avanços. É possível solucionar (o problema da população de rua), mas é preciso a participação de todos”.
- O senhor representa uma pauta bem específica, até por conta de sua atuação profissional, que é a segurança pública. Que leitura você faz desse setor na cidade? Quais os gargalos que o senhor acredita que ainda precisam ser preenchidos?
R: “Gargalos existem na Segurança Pública de um modo geral, não só em Maringá. Por isso acho que a situação deve ser vista de uma forma ampla. Se olharmos os indicadores, as instituições de Maringá cumprem o seu papel. A Polícia Civil, ao qual me orgulho de fazer parte, tem um dos maiores índices de resoluções de crimes do Paraná, assim como a Militar também tem ótimos índices de prevenção da criminalidade. A questão é que, quando olhamos a Constituição, vemos a Segurança Pública como um dever e atribuição do Estado. Não acredito que possa ser simplesmente dessa forma. Acredito que deveríamos lutar, junto aos órgãos estaduais e federais, para que os municípios pudessem ter mais autonomia na área da Segurança Pública. Eu, por exemplo, sou um grande defensor da nossa Guarda Municipal, que acredito que faz um ótimo trabalho. Se ela tivesse mais autonomia em questão de leis, pudesse ser tratada como uma Polícia Municipal, não tenho dúvidas que o trabalho seria ainda melhor. Dessa forma, não ficaríamos tão dependentes de investimentos dos outros entes, já que seria um setor que poderia receber recursos da própria cidade”.
– Além da Segurança Pública, tem alguma outra bandeira que o senhor se identificou mais na sua atividade de vereador?
R: “Além da questão da inclusão, que citei quando falei do projeto dos playgrounds, eu gosto muito das pautas voltadas à Educação, Saúde, Esporte e Lazer. No fim, tudo é uma grande engrenagem. Na Educação, vejo que as escolas têm um papel primoroso de conscientização com as nossas crianças, de tirar elas das ruas, oferecer um futuro digno, seguro, de qualidade. A questão do Esporte e Lazer entra com esse complemento. Acho que seria fantástico se todas as escolas, não só as de Maringá, oferecessem atividades no contraturno relacionadas com essa temática, uma forma simples de tirar as crianças das ruas, não correrem o risco de entrar para a vida do crime. No caso de Maringá, essa solução seria ainda mais simples, pois temos uma ótima infraestrutura, temos escolas perto de centros esportivos, temos transporte público, toda uma rede que permitira levar as crianças para utilizarem esses espaços. E na Saúde, obviamente, em vislumbrar a criação de uma rede que possa oferecer tratamento na dependência química. Já é comprovado cientificamente que isso é uma doença. A Polícia pode prender, mas não pode tratar a dependência química. Claro, entendemos que essas pessoas não podem ser forçadas ao tratamento, por isso acho tão importante as etapas anteriores que citei: Educação, Esporte e Lazer, como formas de prevenir que as crianças tenham contato com esse mundo. Não se trata de inventar a roda, mas de replicar em nossa cidade cases que vemos dando certo em outros lugares.
- Como o senhor classifica a relação da Câmara com o Executivo? E a sua em particular com a Prefeitura?
R: “Acredito que a relação é muito boa. Pelo menos de minha parte, nunca tive problemas. Não me coloco nem como situação, nem como oposição ao Executivo. Me considero apenas um vereador independente, ou seja, se o projeto for benéfico para a cidade, terá meu apoio. Ninguém propõe projetos que podem prejudicar a cidade, acredito, mas se for um caso de algum projeto precisar de alguma adequação, também estaremos lá para ajudar.”
– E a relação do senhor com demais organizações da sociedade civil (Acim, Codem, SRM e similares). É um diálogo produtivo para a cidade?
R: “É uma relação boa também. Qualquer entidade que tenha ideias para melhorar o município sempre terá o meu apoio. Eu sou uma pessoa do bem, é muito difícil alguém ter problema comigo ou eu ter problema com alguma pessoa/entidade específica. Acredito, inclusive, que essa coisa de você desaprovar as ideias de um outro político ou grupo só por ser de situação/oposição é completamente destrutível na política. Nós precisamos usar o espaço para pensar no bem comum e não apenas em questões políticas ou partidárias”.
- Para o futuro, quais são os seus planos políticos? Tem algum outro cargo ou função que gostaria de exercer?
R: “Estar em um cargo público abre portas. Mas como disse, não sou uma pessoa vaidosa. Eu quero ver o bem da comunidade e meu nome está sempre à disposição. Se para seguir atuando eu precisar seguir no legislativo ou em algum outro cargo, iremos discutir futuramente. No momento, posso dizer que sou grato pela função que estou desempenhando”.
- Qual avaliação o senhor faz da administração municipal em Maringá?
R: “Acredito que seja uma boa gestão. Não pude acompanhar de perto o primeiro mandato, mas vendo como a coisa está ocorrendo no segundo, acredito que seja uma gestão boa. Como disse, não sou oposição nem situação, eu vejo o que é bom para a cidade. Claro, existem algumas questões pontuais que poderiam ser melhores, como a revitalização de alguns espaços que, por estarem muito deteriorados, acabam atraindo usuários de drogas. Acredito que esses espaços públicos, quando estão bem cuidados, revitalizados, inibem esse tipo de prática”.
- E avaliação dos Governos Estadual e Federal? Visto que tivemos troca de presidente recentemente.
R: “Governo Estadual acredito que seja bom. Fato disso é a reeleição que ocorreu sem maiores dificuldades. Sobre o Governo Federal, acredito que seja muito pouco tempo para se fazer uma análise. Tenho minhas convicções pessoais, mas procuro não deixá-las interferir em minha análise e, independente de quem estiver no Governo, sempre torcerei para o país ir bem. Vi algumas medidas planejadas que são boas, outras nem tanto, mas precisaria de mais tempo para fazer uma análise mais concreta.”
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Foto: Marquinhos Oliveira/CMM
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