Escolas sem celular: proibição dos aparelhos em sala de aula melhora aprendizado e é aliada no combate ao abuso infantil

Entidades reforçam alerta para temas como cyberbullying, excesso de telas e exposição precoce a conteúdos online.

  • Tempo estimado de leitura: 5 minutos

    Dados do último levantamento divulgado pela ONU (Organização das Nações Unidas) revelaram que, no último ano, cerca de 300 milhões de crianças sofreram exploração sexual e abuso infantil online em todo o mundo — cenário facilitado e agravado pelo uso dos celulares e dispositivos com acesso à internet sem supervisão ou orientação, cada vez mais difuso entre crianças e adolescentes.

    No Brasil, a volta às aulas de 2025 marcou uma mudança significativa nas escolas, agentes essenciais no combate a essa temática: pela primeira vez, o uso de celulares foi formalmente restringido. A medida, que provocou dúvidas no início, agora começa a mostrar bons resultados.

    De acordo com os retornos recebidos pelo Sindicato das Escolas Particulares (Sinepe/PR), os impactos vêm sendo positivos, com relatos de mais atenção durante as aulas e aumento da socialização entre os estudantes.

    Mais do que uma medida pedagógica, a proibição também pode ser uma forma de proteção integral. Ao limitar o uso de celulares, as escolas favorecem o aprendizado e contribuem para um ambiente mais seguro. A medida ajuda a proteger os alunos da exposição precoce a conteúdos inapropriados, do cyberbullying e até do aliciamento online.

    E, nesse sentido, mais do que medidas isoladas, o essencial é o comprometimento de todos os agentes envolvidos. O presidente da entidade, Haroldo Andriguetto Junior, reitera que o debate a respeito do uso dos dispositivos móveis pelos jovens em idade escolar deve ser permanente e envolver educadores, famílias e os próprios estudantes. “Nosso papel é apoiar as escolas na construção de estratégias equilibradas, coerentes com seus projetos pedagógicos e com a realidade de suas comunidades”, reconhece.

    Expectativa de melhoria no aprendizado

    Celso Hartmann, vice-presidente do Sinepe/PR, conta que a aceitação das novas normas vem sendo positiva, tanto por parte das famílias como por parte das escolas. “Percebemos esse empenho em reduzir as telas e promover um ambiente mais saudável para os estudantes e os consequentes benefícios, como a melhora na atenção e na interação social”, afirma.

    De acordo com o gestor, durante o período de adaptação, os intervalos vêm sendo preenchidos por atividades esportivas e lúdicas, além de conversas e momentos de descanso. “Vale destacar o empenho de diretores, coordenadores e orientadores durante este período, sempre atentos às necessidades de cada estudante e prontos a apoiá-los durante a adaptação”, completa.

    Com essas informações, Hartmann espera que haja uma consequente melhoria no aprendizado. Ele destaca estudos citados em livros como “A Fábrica de Cretinos Digitais”, de Michel Desmurget, que mostram que a diminuição do uso passivo de telas (como a que acontece com os celulares e redes sociais) está correlacionada com melhores resultados em matemática, leitura e ciências, além da prática da leitura crítica e o desenvolvimento do pensamento analítico.

    Proibição nas escolas é ponto de partida

    O Sinepe/PR acredita que o maior desafio, daqui em diante, não será apenas manter viva a suspensão do uso dos aparelhos, mas, sobretudo, manter viva a reflexão sobre o uso consciente da tecnologia na escola, avalia o vice-presidente do sindicato.

    Rodrigo Nejm, especialista em educação digital do Instituto Alana, concorda e diz que a legislação deve ser vista como um grande ponto de partida para repensar a presença digital de crianças e adolescentes. “Esse é o momento de trazer a educação digital para combater o uso passivo das plataformas. Hoje, 90% do tempo desses jovens é gasto com jogos e redes sociais”, indica. “Um entretenimento que não contribui para a formação pedagógica e cidadã, além de comprometer habilidades como a socialização e a criatividade”, completa.

    Para que a medida seja ainda mais efetiva, o especialista propõe uma construção coletiva, não apenas da escola e dos professores com os estudantes, mas com o envolvimento dos pais e das empresas que produzem as tecnologias usadas no meio educacional. O desafio não é apenas tirar o celular da mão dos estudantes, mas ajudá-los a entender seu papel como cidadãos digitais. “Precisamos substituir o consumo passivo por uma relação ativa e criativa com a tecnologia — dentro e fora da escola”, sugere.

    Comentários estão fechados.