Por Fabíola Cordovil¹ e Leonardo Barbosa²
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Andar pelas ruas de Maringá está cada vez mais desgastante e enfrentar o trânsito tem solicitado mais paciência. Programar um trajeto nos horários de maior fluxo tem exigido mais antecedência e nada garante estar livre de atrasos. A opção pelo automóvel tem se apresentado cada vez mais ineficiente. Em contrapartida, será que há alternativas mais confortáveis?
A cidade planejada, a melhor para se viver, segundo alguns rankings, vem se aproximando da realidade caótica das cidades brasileiras mais dinâmicas onde o transtorno e a violência no trânsito são notícia há algumas décadas. Se essas cidades caminham para uma situação insustentável, sem dúvida alguma, Maringá vai na mesma rota. Os últimos censos do IBGE têm apontado para o aumento progressivo do tempo de deslocamento diário, o que impacta diretamente na saúde e na qualidade de vida das pessoas.
É sabido que a forma mais eficiente de se deslocar no espaço urbano metropolitano é por meio do transporte coletivo. A lógica é pura e simples, uma vez que este modal é capaz de transportar um maior número de usuários por área ocupada no sistema viário. Por exemplo, como demonstrado no Guia Global de Desenho de Ruas, de 2018, uma faixa de 3 metros de largura no sistema viário, utilizada por automóveis, possui capacidade de transportar até 1.110 pessoas em uma hora, ao passo que a mesma faixa, ocupada exclusivamente por ônibus, pode transportar até 6.000 pessoas no mesmo espaço de tempo.
O transporte coletivo no Brasil tem apresentado, nas últimas décadas, uma perda de usuários e um consequente encarecimento das tarifas, apresentando índices de reajustes acima dos da inflação. Isso se deve à lógica de sustentação tarifária que predomina neste modal, no qual o custo do sistema é financiado pelas tarifas pagas pelos usuários. Assim, ao perder usuários, as tarifas se elevam, ao passo que as tarifas mais elevadas repelem usuários, principalmente a população de menor renda, a que mais utiliza os transportes coletivos. Este círculo vicioso tem levado cada vez mais usuários a optarem pelo transporte individual, agravando os problemas de congestionamento – ao aderirem ao automóvel – e de violência – ao aderirem às motos.
Essa lógica precisa mudar e os debates sobre o tema têm avançado para propostas como a tarifa zero no transporte coletivo. Mas, do que se trata? Como poderia ser implementada numa cidade como Maringá e nas demais cidades do aglomerado urbano?
A tarifa zero é um programa a ser implantado pela municipalidade que garante a gratuidade de passagens para usuários do transporte coletivo e já é uma realidade em mais de 80 municípios, inclusive nos de porte médio, como Caucaia-CE, Maricá-RJ e São Caetano do Sul-SP. As cidades que aderiram à gratuidade do transporte coletivo têm reportado números expressivos de aumento de usuários no sistema, variando entre 33% e 371%, segundo o estudo da Associação Nacional de Empresas de Transporte Urbano (NTU), de 2024.
Quanto mais usuários de transportes coletivos, mais fluida, mais segura e mais sustentável será a cidade, além de proporcionar deslocamentos mais satisfatórios para todos os que transitam, inclusive para os usuários do transporte individual. Ou seja, os que optam por utilizar carros e motos se beneficiam enormemente com mais ônibus e menos carros e motos nas ruas. Além da diminuição da poluição do ar, são favorecidos com percursos mais rápidos, com a qualidade de vida e com menos gastos em combustíveis.
Portanto, se toda a sociedade se beneficia do transporte coletivo, nada mais justo que as contribuições para o custeio do programa da tarifa zero venham também de recursos privados. Especialistas defendem que as contribuições podem ser provenientes do uso de estacionamento de carros e motos em vias públicas, impostos sobre o combustível, além da colaboração do setor produtivo, com recursos de taxa proporcional ao faturamento ou folha de pagamento, ideia que já é realizada por empregadores que pagam o Vale Transporte para seus funcionários.
É certo que deve haver um projeto bem pensado que garanta a participação dos diversos segmentos da sociedade. Alguns municípios, como Araucária, no Paraná, iniciaram o programa isentando de pagamento de passagem aos estudantes e às mães com filhos em creche, além de todos os usuários de ônibus aos domingos. Maringá, desde 2022, faz repasses à TCCC, como forma de subsidiar as gratuidades estudantis e de idosos e segurar os reajustes tarifários. Tal medida, até o momento, teve pouco efeito na elevação do número de passageiros.
Iniciativas no nível federal também se desenham fortemente, como o projeto do Sistema Único de Mobilidade, o SUM, elaborado pelo Instituto de Defesa do Consumidor. O projeto está em debate desde 2022 e visa enfrentar a crise do transporte público e contribuir com o Governo Federal para criação de um novo marco jurídico sobre o transporte coletivo no Brasil. Vale lembrar que, desde 2015, o direito ao transporte faz parte dos direitos sociais listados no artigo 6° da Constituição Federal.
O debate é necessário e a sociedade deve reconhecer que a garantia de bom transporte público para todas as pessoas é seu direito. Em ano de eleições municipais, esse direito pode estar na pauta das candidatas e candidatos e Maringá pode continuar figurando nos rankings das cidades com melhor planejamento urbano do Brasil.
**Artigo da série “Observatório das Metrópoles nas Eleições”, realizada pelo núcleo maringaense do Observatório das Metrópoles, em parceria com o Maringá Post
¹Docente do Departamento de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Estadual de Maringá, UEM, doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP) e pós-doutora em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
²Docente do Departamento de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Estadual de Maringá, UEM, doutor em Arquitetura e Urbanismo pelo Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAU-USP).
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