De acordo com um levantamento feito por pesquisadoras da Unicamp, o Brasil registrou em sete meses 40% do total de ataques em escolas ocorridos nos últimos 23 anos. Espalhar o pânico com notícias falsas também faz parte da estratégia dos envolvidos nos atentados.
Por Victor Ramalho
Dentro do programa de pós-graduação em Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), um grupo de pesquisa dedica-se a mapear todos os casos de violência extrema ocorridos em escolas do Brasil desde 2000. Fundado em 2021, o grupo “Ética, Diversidade e Democracia na Escola Pública” identificou 22 ataques ocorridos nos últimos 23 anos.
O que chama a atenção, no entanto, é a forma como os atentados se intensificaram nos últimos sete meses. Desde setembro de 2022, foram nove ataques, 40% do total registrados em pouco mais de duas décadas. E além desse problema, as notícias falsas envolvendo ameaças de atentados em escolas de todo o Brasil também deixam pais e comunidade escolar em pânico.
Em todo o Brasil e, inclusive, na região de Maringá, estão circulando fake news falando sobre um suposto massacre nesta quinta-feira (20) em várias unidades de ensino pelo país. Forças de segurança e órgãos ligados à Educação dizem que não há indícios de atentados programados e, até o momento, as atividades escolares seguem normalmente.
Espalhar o caos, inclusive, faz parte da forma de atuação desses grupos extremistas, conforme explica a pesquisadora do programa de Mestrado em Educação da Unicamp, Cleo Garcia. Segundo ela, o engajamento gerado pelas notícias falsas é comemorado dentro das comunidades virtuais que reúnem esses indivíduos.
“Depois que a mídia deu destaque para alguns crimes, tivemos um efeito de contágio. Todo crime precisa da repercussão da mídia para ocorrer. Em relação as ameaças falsas, precisamos pensar em quem tem interesse em propagar esse tipo de ameaça. Elas nunca surgem de forma inocente, têm sempre um objetivo. Quem dissemina, tem sempre esse apelo emocional, de identificação e quem origina apela para que as pessoas entendam que aquilo é algo verdadeiro e, normalmente, não é. Então, precisamos pensar: a quem interessa o esvaziamento das escolas e a quem interessa colocarmos policiais armados nesses locais. São questões muito complexas e nós estamos sempre orientando as pessoas a não darem engajamento nesse tipo de conteúdo, que é sempre muito comemorado nas comunidades mórbidas, que cultuam esse tipo de assunto”, diz a pesquisadora.
O modus operandi é sempre o mesmo. Adolescentes vulneráveis, que passam por algum tipo de sofrimento no ambiente escolar e encontram conforto no ambiente virtual. São nos fóruns que eles encontram outras pessoas que compartilham dos mesmos pensamentos e os cooptadores, que estimulam os ataques. De acordo com Garcia, nesses lugares circulam conteúdos que estimulam o culto às armas e discursos extremistas carregados de misoginia e preconceito contra minorias.
“As pessoas que fazem essa cooptação de jovens dentro desses ambientes estão atentas a essas falas, discursos de ódio e sofrimento por parte dos adolescentes que são levados para essas comunidades. E eles fazem um acolhimento muito eficiente, convidam os adolescentes a participarem de comunidades que cultuam esse tipo de crime, fazem viralizar conteúdos que vangloriam autores de ataques”, afirma a especialista.
As notícias falsas envolvendo ataques no dia 20 de abril circulam pelo Brasil há, pelo menos, quatro anos. A data não é escolhida aleatoriamente, uma vez que já existem pesquisas que mostram que o dia 20 é uma alusão ao aniversário de Adolf Hitler, figura cultuada dentro dos fóruns extremistas.
Ainda segundo a pesquisadora, o ambiente eleitoral extremo vivido em 2022 e o retorno recente à normalidade pós-pandemia podem ter potencializado os ataques recentes.
“São muitos os fatores que levam a esse crescimento. Não podemos ignorar que nós estamos vindo de um período eleitoral de discursos extremos e de um adoecimento mental e social muito grande, em função da pandemia. Os adolescentes estão vindo de um período muito grande afastados das escolas e vivendo, basicamente, em ambientes virtuais, além de questões de violência dentro da própria casa. Então eles tiveram um acesso muito fácil a chats, fóruns, etc. Estamos falando aqui de adolescentes que já vinham de algum sofrimento dentro do próprio ambiente escolar, como bullyng, exclusão e que encontraram acolhimento em comunidades virtuais recheadas de discursos extremistas”, finaliza.
Foto: Ilustrativa/Marcelo Camargo/Agência Brasil
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