Para a terceira edição do quadro Especial da Semana, o Maringá Post conversa com a vereadora Professora Ana Lúcia (PDT) sobre a tarifa zero do transporte público coletivo urbano.
O objetivo deste quadro é conversar com uma autoridade por semana sobre algum tema específico que seja defendido ou abarcado durante o exercício da profissão.
BIOGRAFIA
Ana Lúcia é graduada em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Arapongas (FAFICLA). Além disso, é Mestra em Filosofia e Doutora em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Professora aposentada do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá (UEM), ao longo de 34 anos atuou nas áreas de sociologia urbana, ciência política e políticas públicas. Foi coordenadora do Núcleo de Pesquisa Observatório das Metrópoles.
Esta trajetória a fez ter mais contato com as realidades local, regional, estadual e nacional. Por conta disso, desenvolveu interesse em se envolver na vida política.
Ao ser eleita vereadora em Maringá pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) no ano de 2020, contrariou os prognósticos que não previam a própria eleição. No total, como apontado em nota redigida pela Associação dos Docentes da UEM (ADUEM), recebeu 2.707 (dois mil setecentos e sete) votos.
A tese de doutorado da vereadora foi sobre a relação das políticas de desenvolvimento urbano com a segregação socioespacial de Maringá. Resumidamente, a pesquisa mostra que a segregação é prevista no projeto da própria cidade. Os limites florestais da cidade são, também, limites sociais. Entre os parques locais, localizam-se a área central da cidade e a zona residencial principal. A população de baixa renda é segregada para além dos bosques locais, nas áreas menos favorecidas.
TARIFA ZERO NO TRANSPORTE PÚBLICO
Importância da tarifa pública gratuita
Ana Lúcia aponta que o transporte é um direito social assegurado à população no Artigo 6º da Constituição Federal. A Constituição garante, também, o direito de ir e vir. Contudo, diz, o custo da mobilidade é elevado. Além disso, trajetos de longa distância não são facilmente percorridos a pé, especialmente para quem mora longe da área central municipal.
A mobilidade torna-se uma necessidade.
Em adição, aponta, o Plano Nacional de Mobilidade assegura a prioridade do modal coletivo sobre o individual.
Se a prioridade fosse o modal individual, afirma a vereadora, as cidades parariam.
Realizada anualmente, a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta Ana Lúcia, mostra que as famílias brasileiras gastam a maior parte do orçamento em aluguel e em mobilidade. A renda familiar é baixa, seja no Brasil inteiro, seja em Maringá, afirma.
Estas são as razões pelas quais surge a necessidade da construção de políticas que tragam a tarifa zero do transporte público em todo o Brasil, diz.
Investimento ou gasto?
Quando uma questão social envolve o orçamento público, afirma, não existem gastos. Cada centavo deve ser um investimento para garantir o bem-estar da população.
A prefeitura, o Estado e a Nação devem reservar recursos para o pagamento do transporte, pois este é um direito social.
Mas os atuais modelos de concessão priorizam exclusivamente às empresas de transporte. No Brasil, afirma, elas formam uma espécie de cartel. Dividem-se entre as licitações, o que impede ou diminui a possibilidade de haver concorrência.
O Transporte Coletivo Cidade Canção (TCCC), de Maringá, operava sem licitação.
Quando uma licitação foi aberta na cidade, o TCCC foi vencedor entre a concorrência, de duas ou três empresas.
Porém, pontua Ana Lúcia, o Observatório das Metrópoles aliado a um vereador, que ela preferiu não identificar, mostrou que a licitação dirigia-se ao TCCC. Entre as exigências do documento, encontravam-se micro-ônibus e uma garagem de tamanho específico que apenas tal empresa possuía.
Apesar de terem entrado com uma denúncia, que foi acatada, o Tribunal de Justiça (TJ) deu ganho de causa ao TCCC.
Portanto, a destinação de verba pública para o transporte gratuito seria, sim, um investimento, diz.
Isto se justifica pelo transporte ser um direito e pela necessidade de um transporte coletivo de qualidade. A medida também incentivaria a população que tem carro a se movimentar pela cidade por meio do transporte público, afirma.
Redução do preço da passagem
A tarifa zero é um direito e uma necessidade, diz Ana Lúcia. Por isso, não seria ideal a Prefeitura de Maringá arcar com parte dos custos da passagem, ao invés de custeá-la por inteiro.
Cade ao poder público destinar verbas para garantir a tarifa zero ao consumidor. O Estado e a União devem repassar verbas para que a Prefeitura possa arcar os custos de um sistema de transporte gratuito, afirma a vereadora.
A União, diz, desloca mais da metade do orçamento para pagar os juros de dívidas com os grandes bancos e financeiras que emprestam dinheiro à nação. Desta forma, o orçamento federal enriquece os banqueiros.
Os recursos da União devem voltar para os Estados e municípios de tal forma que garantam os direitos sociais da população brasileira — composta majoritariamente por pessoas de baixa renda, afirma.
O poder público, diz, deve remunerar os serviços de transporte, mas sem o objetivo de enriquecê-los.
A fala de Ana Lúcia se deve a uma contrato em Maringá que garante 40 anos de concessão ao TCCC. A Prefeitura entrega R$66 milhões para a empresa de transporte sem que haja atuação efetiva, afirma. Em adição, a empresa é ressarcida caso a expectativa de lucro não seja cumprida.
O sistema do TCCC, relata, é caro e conta com ônibus precários. Por isso, Ana Lúcia afirma que o valor de R$66 milhões é um presente por parte da Prefeitura de Maringá.
Por parte de Maringá, aponta Ana Lúcia, falta vontade política para a implantação da tarifa zero no transporte público.
Filme favorito
O filme favorito de Ana Lúcia é o faroeste Homem Morto (1995). A vereadora nos conta que a produção a marcou por conta da frase “Alguns nascem para o doce deleite, outros para a noite infindável.”
Foto: Maringá Post
Atualizado às 11h46min
Comentários estão fechados.