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Por Wilame Prado, especial para o Maringá Post
Maringá foi impactada com o vídeo “Adultização”, publicado no YouTube pelo influenciador Felca no dia 6 de agosto. Assim como todo o País. Já são mais de 48 milhões de visualizações e ação rápida da Justiça e do Legislativo: prisão de Hytalo Santos, pivô do documentário e agora suspeito por crimes sexuais envolvendo crianças e adolescentes, e a aprovação no Congresso do chamado ECA Digital, PL que cria regras para a proteção de crianças e adolescentes quanto ao uso de aplicativos, jogos eletrônicos, redes sociais e programas de computador.
Após a repercussão de “Adultização”, um vereador apresentou projeto de lei prevendo multa pecuniária para combater a adultização infantil e um comentário triste e real no vídeo de Felca chamou a atenção por relembrar um dos mais chocantes casos de pedofilia em toda a história de Maringá: o assassinato de Márcia Andréia do Prado Constantino, em 20 de outubro de 2007. Ela tinha 10 anos de idade. Quanto a um possível aumento de denúncias de crimes sexuais após o “Efeito Felca em Maringá”, a Polícia Civil ainda realiza levantamentos para apresentar dados estatísticos recentes.
Caso Márcia Constantino
O comentário no vídeo de Felca foi feito por André Constantino, irmão da vítima Márcia Constantino, criança encontrada morta após ter sido raptada no pátio de uma igreja evangélica, abusada sexualmente, morta asfixiada e depois queimada numa área rural de Maringá. Márcia foi encontrada três dias depois, e o assassino chegou a auxiliar nas buscas. Trata-se de Natanael Búfalo, réu confesso condenado a 43 anos de reclusão.
Dezenas de pessoas responderam ao comentário de André Constantino, demonstrando apoio e lamentação diante da crueldade do caso. Escreveu assim o maringaense nos comentários do vídeo “Adultização”, de Felca:
“Eu perdi uma irmã para a pedofilia, ela tinha 10 anos de idade e o pedófilo pegou ela, fez o que fez, matou com uma sacola na cabeça e depois levou para uma plantação de milho e ateou fogo. Eu tenho pavor, e como o Felca diz: dá vontade de vomitar. Estou comentando porque este vídeo precisa engajar o máximo, para alcançar pessoas poderosas e gerar monetização para ajudar ONG´s que trabalham contra pedofilia. Parabéns, Felca, estou em Maringá (do lado de Londrina) e quando quiser bater um papo sobre a minha história que aconteceu em 2007 com minha irmã, estamos curados para podermos falar.”

O Maringá Post entrou em contato com André Constantino, que afirmou estar dialogando com os pais para uma entrevista ao portal de notícias, pois considera importante o combate de todos contra a pedofilia.
Ele adiantou à reportagem, porém, que a família segue atuante na igreja, e ele próprio hoje realiza um trabalho de valorização da família e transformação de casamentos. Marcos e Nelir, pais de Márcia Constantino, seguem como pastores da Assembleia de Deus e houve, na gestão passada da Prefeitura Municipal, o início de um diálogo com familiares para transformar “Márcia Constantino” em nome de rua, em Maringá.

Delegada do Nucria alerta para os perigos da pedofilia
Para a delegada Karen Friedrich, do Nucria (Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente), é fundamental usar este momento para alertar sobre a realidade do problema. De acordo com a delegada, os crimes sexuais de maior incidência investigados pelo órgão da Polícia Civil do Paraná são o estupro de vulnerável e o estupro mediante violência ou grave ameaça.
“No estupro de vulnerável, que é praticar ato libidinoso ou ter conjunção carnal com menor de 14 anos, a lei diz que o consentimento da vítima é irrelevante. Além desses, também lidamos com a importunação sexual, como toques no corpo com o intuito de satisfazer a lascívia, e crimes previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”, explica a delegada.
Ela alerta que, contrariando a percepção popular, a maioria dos crimes sexuais não ocorre em ambientes desconhecidos, mas sim no âmbito familiar. O agressor costuma ser alguém próximo e de confiança, como padrastos, avós, meios-irmãos, primos, vizinhos ou amigos da família.
Sinais de alerta e a importância do diálogo
A delegada ressalta a importância de os pais ficarem atentos a mudanças de comportamento dos filhos, que podem ser um indicativo de que algo está errado. Sinais como queda no rendimento escolar, falta de interesse em atividades antes prazerosas (esportes), comportamento recluso e depressivo, automutilações e o hábito de evitar certas pessoas merecem atenção imediata.
Segundo a delegada, a ausência de diálogo sobre sexualidade e violência sexual em casa dificulta a denúncia. “Infelizmente, notamos que algumas crianças são vítimas de violência por anos porque, mesmo em um lar protetivo, não se sentem seguras para relatar o abuso”, afirma. Nesses casos, a denúncia muitas vezes vem de fora da família, sendo comunicada por professores, diretores ou até mesmo por colegas na escola.
Perigos do ambiente digital
Além da violência no lar, a delegada Karen Friedrich enfatiza os perigos atuais que rondam as crianças e adolescentes na internet. A delegada destaca que o compartilhamento e o armazenamento de pornografia infantil e conversas de cunho sexual são crimes comuns no ambiente virtual.
“É perigoso ver crianças com 7 ou 8 anos já com redes sociais e acesso à internet. Os pais precisam fiscalizar”, alerta a delegada. Ela explica que criminosos se aproveitam do ambiente virtual para se aproximar das vítimas, oferecendo itens como créditos em jogos online e PIX. Em uma investigação recente, a polícia prendeu um suspeito que mantinha uma pasta com diversas vítimas, sendo que o contato inicial foi estabelecido pelo Instagram.
Karen finaliza reforçando a necessidade de que os pais mantenham uma fiscalização constante sobre a vida digital dos filhos, protegendo-os dos perigos de estranhos que, em vez de estarem na rua, podem estar “dentro de casa”, no ambiente virtual.
CASOS NO HU, UMA TRISTE REALIDADE
Mulheres menores de idade entre 2 anos e 14 anos de idade foram as principais vítimas de violência sexual nos casos atendidos no Hospital Universitário de Maringá, o HU da UEM.
Segundo dados do Núcleo de Vigilância Epidemiológica (NVEH) da instituição, desde o começo do ano foram atendidas 97 mulheres (85,84%) e 16 homens (14,16%). Entre estes, 26 vítimas tinham entre 10 e 14 anos (23,01%), enquanto 21 tinham entre 2 e 4 anos (18,58%) e 19, entre 20 e 29 anos (16,81%), o que concentra os atendimentos na violência sexual em mulheres menores de idade.
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