Único médico entre os 15 vereadores da atual legislatura, o parlamentar afirma ver um elo entre a profissão e a atividade pública. “Para que ela (Medicina) tenha um efeito real, necessita de planejamento e de ações que assim a promovam”.
Por Victor Ramalho
Já são pouco mais de 40 anos dedicados a vida pública, com 14 deles na atividade de vereador em Maringá. Mesmo assim, Manoel Sobrinho (PL) segue vivo no imaginário de grande parte da população como o “Doutor Manoel”, o médico da família do Jardim Alvorada ou do Parque Residencial Quebec.
Doutor Manoel é o convidado desta semana do Maringá Post para a série de entrevistas com os vereadores da cidade. Único médico entre os atuais 15 representantes do legislativo, ele conta os motivos que o levaram a entrar para a política, os projetos que mais se orgulha de ter proposto e faz uma avaliação do Poder Público municipal, estadual e federal.
Para ele, a atividade parlamentar é uma extensão do que ele entende como Medicina. Foi ainda no início da carreira, revela ele, que percebeu que apenas o conhecimento técnico da área de atuação não bastaria sem políticas públicas que direcionassem a atividade para onde ela precisaria chegar.
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“Coloquei em mente que, por meio dela (a medicina), eu precisava oferecer às pessoas aquilo que eu mesmo não tive. E foi no dia a dia, atuando em cidadezinhas do próprio Rio Grande do Norte e, depois, aqui do Paraná, que eu percebi o quanto a Medicina é dependente de políticas públicas. Ou seja, para que ela tenha efeito real, preventivo e positivo na vida das pessoas, necessita de planejamento e de ações que assim a promovam”, diz.
E foi com esse propósito que a ideia de se candidatar a vereador de Maringá veio. Antes disso, ainda teve uma candidatura para prefeito de Barbosa Ferraz, primeira cidade onde o médico, oriundo do Rio Grande do Norte, trabalhou em terras paranaenses. Em 2001, já com a alcunha de “Doutor Manoel”, foi eleito para o legislativo da Cidade Canção com 1.724 votos.
“Eu reconheci a política como um espaço de dedicação, como um instrumento de trabalho pelo qual posso ajudar a sociedade. Foi com este propósito que eu me candidatei a prefeito em Barbosa Ferraz e, mais tarde, quando constituí família em Maringá, me candidatei a vereador. E é com este mesmo objetivo que eu sigo, muito grato à população, tanto atuando como parlamentar, quanto clinicando como médico”, complementa.
A atuação em defesa da saúde pública e das causas sociais fizeram Manoel Sobrinho ter um papel de destaque nos movimentos progressistas em Maringá. Sendo a cidade uma com os melhores índices socioeconômicos do Brasil, a visão política predominante, seja no Executivo ou no Legislativo, tende a ter um viés mais conservador. Mesmo assim, o parlamentar foi o último eleito pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), lá em 2012, um movimento que chama a atenção, sendo a sigla um dos partidos de esquerda mais fiel aos seus ideais.
Em 2020, o vereador decidiu deixar a sigla e migrou ao Partido Liberal (PL), de uma visão antagônica, o que causou estranheza por parte do eleitorado mais antigo. Três anos depois, Doutor Manoel fala pela primeira vez sobre a mudança de partido. Segundo ele, faz parte de sua atuação política legislar sem o viés polarizador.
“Seja na política, seja na profissão, seja na vida pessoal, a polarização tem potencial negativo. Eu prefiro fazer o certo e me esforço em ser correto em todos esses campos. Prefiro não ideologizar o debate para me posicionar a favor do que é certo, do que é de interesse da cidade e daquilo que é urgente para as pessoas que mais dependem das políticas públicas. Neste sentido, guardo meu respeito à passagem pelo PCdoB e, é claro, agradeço ao PL por ter entendido esse posicionamento, me permitindo trabalhar sem fisiologismos”, explica.
Confira a entrevista completa abaixo:
- Para que os eleitores, sejam os mais antigos ou a geração mais nova possam te conhecer: O que motivou o senhor a se candidatar a vereador pela primeira vez?
R: “Minha família e eu enfrentamos uma realidade muito difícil no sertão do Rio Grande do Norte. Além da seca e da falta de alimentos, lá também eram escassas as oportunidades de acesso à educação e à saúde. E foi justamente por ter sofrido naquela realidade que eu me motivei a fazer diferente. A duras penas, concluí minha formação superior e assumi a Medicina não como uma profissão, mas como um sacerdócio. Coloquei em mente que, por meio dela, eu precisava oferecer às pessoas aquilo que eu mesmo não tive. E foi no dia a dia, atuando em cidadezinhas do próprio Rio Grande do Norte e, depois, aqui do Paraná, que eu percebi o quanto a Medicina é dependente de políticas públicas. Ou seja, para que ela tenha efeito real, preventivo e positivo na vida das pessoas, necessita de planejamento e de ações que assim a promovam.
Quando morei em Barbosa Ferraz, durante a década de 1980, tive a felicidade de ser convidado a administrar o Departamento Municipal de Saúde. Ali, com a responsabilidade de colocar em prática tudo o que aprendi e defendi, tomei gosto pela vida pública. E, num esforço conjunto com a comunidade e com a prefeitura, conseguimos, por exemplo, reduzir a mortalidade infantil de forma acentuada e construir Unidades Básicas de Saúde na sede e nos distritos.
Então, eu reconheci a política como um espaço de dedicação, como um instrumento de trabalho pelo qual posso ajudar a sociedade. Foi com este propósito que eu me candidatei a prefeito em Barbosa Ferraz e, mais tarde, quando constituí família em Maringá, me candidatei a vereador. E é com este mesmo objetivo que eu sigo, muito grato à população, tanto atuando como parlamentar, quanto clinicando como médico.”
- Passados 4 mandatos, que avaliação faz do próprio trabalho? Tem algum projeto do qual se orgulha mais?
R: “Participar do desenvolvimento de Maringá, ouvindo o que as pessoas precisam agora e planejando a cidade para o amanhã, é muito gratificante. Na Câmara, somo um histórico de defesas – por vezes, muito efusivas, reconheço – à Saúde, à Educação, ao Meio Ambiente e pelo respeito aos diferentes grupos sociais, especialmente aqueles classificados como minoritários. Acredito que foram e ainda são debates proveitosos e benéficos para o Parlamento e, principalmente, para a comunidade maringaense, como um todo.
Quando me opus de forma veemente à incineração de lixo no município, durante a gestão do então prefeito Silvio Barros II, por exemplo, consegui chamar a atenção da sociedade para as consequências dessa prática, que seriam absolutamente danosas ao meio ambiente e, claro, para a saúde de todos nós.
Mais recentemente, quando propus a proibição do uso de cigarros eletrônicos em ambientes fechados e em locais de prática esportiva, também tive a felicidade de ver os maringaenses discutindo os malefícios desses dispositivos para a saúde de quem fuma e, principalmente, de quem não fuma. Agora, com a proibição imposta por lei, tenho percebido a prevalência do respeito.
É difícil elencar um projeto do qual mais me orgulhe porque, na elaboração de todos, tive o cuidado de consultar os nichos sociais interessados, de me preocupar com os impactos positivos e de fomentar o amplo debate. De toda forma, posso pinçar alguns deles e dizer que me orgulho muito de: ter criado um programa permanente de reforço escolar na Rede Municipal de Ensino; de ter estabelecido a obrigatoriedade de hospitais e clínicas oferecerem atendimento odontológico aos pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva; e de ter criado no calendário maringaense o Dia Municipal de Combate à Homofobia.”
- Tem algo que o senhor gostaria de ter feito enquanto vereador e ainda não teve a oportunidade? Ou alguma pauta que tentou colocar em discussão e, por algum motivo, não caminhou?
R: “Muitas coisas (risos). É que, embora o Poder Legislativo tenha a característica de ser o mais próximo das pessoas, seja pela representação das diferentes parcelas da sociedade, seja pelo contato mais direto com a comunidade, a atuação do vereador é limitada. Nós, parlamentares, temos a obrigação de fiscalizar, de cobrar e de orientar o prefeito e sua equipe de secretários sobre onde e como atender as pessoas, como e onde aplicar os recursos. Mas, cumprindo a lei, não podemos decidir como administrar e com qual prioridade resolver os problemas que nos são apresentados diariamente. Sempre faço questão de relembrar essa diferença entre as funções dos vereadores e do prefeito para que o cidadão consiga avaliar cada instituição de forma distinta.
Em linhas gerais, independentemente da composição, a Câmara de Maringá se posiciona e trabalha à altura da cidade. Ora é mais progressista, ora é mais conservadora, mas nunca se furta de promover e de acolher debates em torno de assuntos e de mudanças, ainda que tenham potencial de gerar polêmica.
Por eu ser um defensor da democracia e do Parlamento, ainda me frustro ao perceber que boa parte das discussões aconteçam sem a presença, sem a participação mais ativa da população nas sessões plenárias. Por diversas vezes, nesta legislatura e em legislaturas anteriores, eu propus a mudança de horário de ao menos uma das duas reuniões semanais para o período noturno. Seria uma oportunidade de as pessoas estarem presentes, cobrando e fiscalizando nosso trabalho. Por razões administrativas, no entanto, os colegas vereadores, sobretudo os membros da mesa diretiva, se opuseram e as propostas não prosperaram.”
- Como o senhor classifica a relação da Câmara com o Executivo? E a sua em particular com a Prefeitura?
R: “Nesta legislatura, a relação entre os poderes tem sido bastante harmônica – o que, é importante deixar claro, não significa passividade de qualquer dos lados. É que, diferentemente do perfil de gestões anteriores, durante as quais as divergências tinham de serem levadas ao plenário, acalorando o debate, o perfil da atual gestão é baseado no diálogo. Ou seja, enquanto os projetos de autoria do Executivo tramitam pelas comissões permanentes, sendo analisados pelos vereadores, as dúvidas são sanadas e as possíveis alterações são debatidas, justamente com o objetivo de que as discordâncias sejam amenizadas. Tem sido comum a presença de servidores do quadro técnico e até mesmo de secretários nas reuniões das comissões. Isso cria um ambiente harmônico porque, como resultados, nós temos a função parlamentar cumprida e respeitada e, claro, o Executivo tem suas matérias mais bem exploradas, sem enfrentamentos negativos ou polêmicos em plenário. Por ter sido vereador, o agora prefeito Ulisses Maia entende a importância do Legislativo diante da opinião pública e, como se comprova, soube construir uma relação progressista com os parlamentares.
No mais, sou bem recebido e tenho as demandas ouvidas por toda a equipe da Administração Municipal. Costumo frequentar as secretarias municipais, repassando e endossando as solicitações que a comunidade me apresenta, buscando soluções conjuntas. Então, para além das ações legislativas, que demandam a apresentação formal de requerimentos e indicações aprovados durante as sessões plenárias, os profissionais que compõem a Administração têm facilitado o diálogo.”
- E a relação do senhor com demais organizações da sociedade civil (Acim, Codem, SRM e similares). É um diálogo produtivo para a cidade?
R: “Da minha parte, reconheço a representatividade e a importância de cada uma delas para a cidade. E, da parte delas, percebo a mesma posição. Então, por mais que tenhamos assumido diferentes defesas na discussão e na votação de algumas matérias, o que é absolutamente natural e saudável ao fazer político, nossa relação sempre foi pautada pelo respeito. Ora prevaleceu o entendimento dessas organizações, ora prevaleceu a minha compreensão. E é assim, de forma madura, que, seja quais forem as próximas pautas, a gente seguirá debatendo ideias por um objetivo comum: Maringá.”
- O senhor se destacou pela defesa às causas sociais, foi o último vereador que o PCdoB conseguiu eleger na cidade. Com isso, quem te acompanha há mais tempo estranhou sua migração ao PL. O que fez o senhor mudar de partido?
R: “Eu tinha certeza que esta seria uma das perguntas (risos). E agradeço pela oportunidade de conversar sobre isso.
Como eu disse lá no comecinho da entrevista, eu me interessei pela vida pública, me candidatando e ocupando cargo eletivo, porque conduzo a política como um lugar de tomada de decisões que precisam, obrigatoriamente, melhorar a vida das pessoas. E, para decidir, é necessário ouvir. É necessário debater ideias, pontos de vista dissonantes, entendimentos diferentes. É necessário priorizar o interesse público. Este é o ponto central.
Então, ao longo do tempo, independentemente da sigla partidária, eu jamais conduzi meus mandatos como uma extensão meramente ideológica, unicamente com pautas mais alinhadas à esquerda ou simplesmente com agendas mais comuns à direita. Ao contrário, como a própria pergunta mencionou, eu sempre dei destaque às causas sociais. E as causas sociais que foram e continuam fundamentalmente indispensáveis à população são, por exemplo, a Saúde e a Educação. Elas são sociais, são comuns a mim, a você, ao leitor do Maringá Post e a toda a sociedade. Não são deste ou daquele partido, não são de esquerda ou de direita.
Seja na política, seja na profissão, seja na vida pessoal, a polarização tem potencial negativo. Eu prefiro fazer o certo e me esforço em ser correto em todos esses campos. Prefiro não ideologizar o debate para me posicionar a favor do que é certo, do que é de interesse da cidade e daquilo que é urgente para as pessoas que mais dependem das políticas públicas. Neste sentido, guardo meu respeito à passagem pelo PCdoB e, é claro, agradeço ao PL por ter entendido esse posicionamento, me permitindo trabalhar sem fisiologismos.”
- Para o futuro, quais são os seus planos políticos? Tem algum outro cargo ou função que gostaria de exercer?
R: “Pode parecer clichê, mas é uma espécie de mantra pessoal: o futuro a Deus pertence. Então, é por meio da fé que encontro respostas e tomo decisões. Mas posso adiantar que estou muito animado, muito disposto a continuar legislando por Maringá e me dedicando ao desenvolvimento desta cidade.
Até o início desta legislatura, eu conciliava o mandato na Câmara Municipal com o atendimento médico em dois turnos nos postos de saúde do [Jardim] Alvorada e do [Parque Residencial] Quebec e, ainda, com o meu consultório particular. Se dependesse unicamente da minha vontade, eu continuaria lá nos bairros recebendo meus pacientes, mas a lei diz que existe a aposentadoria compulsória (risos). Então, com um pouco mais de tempo para o dia a dia, me sinto fortalecido. Tenho me dedicado ainda mais à Câmara e ao consultório. E é assim que pretendo continuar.”
- Qual avaliação o senhor faz da administração municipal em Maringá?
R: “Avalio positivamente. Como disse, não tenho enfrentado problemas na relação parlamentar com os secretários ou mesmo com o prefeito. E, sempre que possível, com responsabilidade, a equipe tem respondido satisfatoriamente às solicitações que encaminho e efetivado as políticas públicas que proponho.
Evidentemente, toda gestão tem seus altos e baixos. E eu não ignoro isso. Tenho ouvido queixas e, cumprindo com o meu dever, repassado à Administração por meio de documentos ou de reuniões. Mas o cenário é positivo para este final de mandato, com recursos e projetos do Executivo já aprovados pela Câmara, sendo gradativamente implementados – entre eles, o necessário recapeamento asfáltico de ruas e avenidas nos bairros da cidade.”
- E avaliação dos Governos Estadual e Federal? Visto que tivemos troca de presidente recentemente.
R: “Com o Governo do Paraná e com a Assembleia Legislativa do Paraná, meu contato é mais frequente e muito positivo. Tenho boas relações com os deputados estaduais de Maringá e da nossa região e, com o auxílio deles, encaminhei várias pautas e posicionamentos em prol da cidade para o governador Ratinho Junior. Foram demandas da área esportiva, com a solicitação de kits para os alunos dos colégios estaduais, da segurança pública, endossando a necessidade do reforço do contingente da Polícia Militar, e relativas à mobilidade, manifestando repúdio à previsão de aumento do número de praças de pedágios nas rodovias próximas a Maringá. Esses diálogos resultaram, por exemplo, no fornecimento de materiais esportivos para cinco escolas estaduais, e no comprometimento público pelo aumento do efetivo policial para a cidade.
E, ao meu ver, é assim que o vereador, independentemente de suas opiniões particulares sobre governos A ou B, precisa atuar: construir um trabalho conjunto, propositivo e resolutivo.”
Foto: Marquinhos Oliveira/CMM
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