Maioria dos inscritos no vestibular de inverno da UEM é branca, tem renda de até cinco salários mínimos e estudou em escola particular. 29% são de Maringá

  • Dos 15.940 inscritos no Vestibular de Inverno 2018 da Universidade Estadual de Maringá (UEM), a maioria é branca, tem renda de três a cinco salários mínimos e estudou durante toda a vida em escola particular. Os dados são do Questionário Socioeducacional divulgado pela Comissão do Vestibular Unificado (CVU) que organiza o exame.

    Durante a inscrição, 11.623 candidatos se declararam brancos, o que representa 72,9% do total de inscritos. Quando o campo para ser preenchido era referente a renda, 25,73% declararam ter uma renda mensal que varia de três a cinco salários mínimos e 83% não trabalham e têm seus gastos custeados pela família ou outras pessoas.

    A maioria dos inscritos também estudou integralmente em escolas particulares. Em relação ao Ensino Fundamental, a diferença é pequena: enquanto 42% estudaram em escola particular, 40% frequentavam a escola pública.

    A diferença sobe quando é perguntado sobre o Ensino Médio. Nesse ponto, 52% estudaram ou estudam na rede particular, enquanto 39% estudaram ou vão concluir os estudos em escolas públicas.

    O número de participantes femininos representa 59,27% dos inscritos e a maioria dos candidatos a uma vaga na universidade tem 17 anos. 52% dos candidatos também informaram que não frequentaram ou não frequentam curso de pré-vestibular.

    O levantamento da universidade também revelou que 33% dos candidatos moram em cidades da região noroeste enquanto 29% moram em Maringá.

    Neste ano serão ofertadas 1.492 vagas e desse total 287 são para cotistas. A graduação de medicina continua como a mais concorrida com 4.380 inscrições não cotistas e 619 de cotistas. Para o curso serão ofertadas apenas 13 vagas para não cotistas e a concorrência de inscritos por vaga é de 336,9. Para cotistas são três vagas e a concorrência é de 206,3.

    Cotas raciais são urgentes, afirma mestre

    Para o mestre em Ciências Sociais, Rodrigo Pedro Casteleira, o levantamento revela uma soma de fatores que impedem o acesso dos estudantes ao ambiente acadêmico.

    “Esses dados mostram que não temos só uma questão de classe, temos um desenho estrutural que está ligado a noções racistas por causa do histórico brasileiro”, afirma.

    Como mostra o levantamento, 83% dos inscritos no vestibular não trabalham e têm os gastos financiados pelos pais. Para Rodrigo Casteleira, essa é uma realidade totalmente diferente de alunos da rede pública.

    “Muitas das pessoas que estão na rede privada não vão precisar trabalhar, por conta de uma estrutura econômica que subsidia tudo isso. Um jovem que nasça no seio dessa estrutura já nasce com vantagem em relação as outras pessoas”, diz o professor.

    Segundo Casteleira, além das dificuldades estruturais e sociais que as escolas públicas enfrentam, esses fatores revelam a “necessidade urgente” de uma política de cotas raciais na universidade.

    A UEM tem apenas o sistema de cotas sociais. Se encaixam nesse sistema de cotas os candidatos que tenham cursado todas as séries na rede pública, não tenha diploma de curso superior e que comprove a renda familiar bruta mensal de até 1,5 salário mínimo.

    O Núcleo de Estudos Interdisciplinares Afro-Brasileiros (Neiab-UEM), com outros órgãos coletivos da universidade, tem implementado essa discussão dentro da UEM.

    De acordo com Casteleira, o argumento da universidade é que não existe demanda por cotas raciais, mas para ele, “a sensação é que a instituição fica criando obstáculos e impossibilidades para aplicação”.

    Discussão sobre cota raciais está avançando

    As cotas raciais na UEM são discutidas desde 2008, quando a universidade regulamentou a implantação das cotas sociais.

    As cotas raciais também foram discutidas pelos órgãos colegiados da instituição naquele ano, mas não foram aprovadas. Na época, o argumento era que as cotas sociais resolveriam o problema e dariam mais espaço para alunos negros na universidade.

    Para a vice-coordenadora do Neiab, Marivânia Conceição Araújo, que participou da discussão em 2008 e hoje atua dentro da UEM pela implantação das cotas raciais, os resultados esperados não se concretizaram.

    “A gente já tem anos de cotas sociais, mas não mudou o perfil de raça na universidade, que ainda continua sendo majoritariamente branca”, diz.

    Segundo Marivânia, os alunos com renda mais baixa e que se encaixam no sistema de cotas sociais conseguem entrar em cursos menos concorridos, enquanto os negros não têm acessos a essas graduações.

    “A UEM está atrasada. É a única universidade do Estado que não tem cotas raciais”, afirma. Segundo ela, as discussões estão avançadas na universidade, apesar de não haver confirmação de que o pedido tenha chegado ao reitor.

    “Tem uma movimentação nas hierarquias da UEM e assinaturas já foram colhidas”, assegura a vice-coordenadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares Afro-Brasileiros.

    Para o debate ser levado aos órgãos deliberativos da UEM, é necessário que o reitor protocole o pedido. Depois disso, o assunto deve ser discutido pelos membros do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão e o Conselho Universitário, que dará um parecer final.

    Marivânia diz que é otimista e espera que no vestibular de verão de 2020, o sistema de cotas raciais já esteja implantado.“Hoje temos uma possibilidade maior que antes, quando a comunidade estava alheia à discussão. Os alunos estão cobrando e reivindicando”, afirma.

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