Ao contrário do que ocorre na Comissão Processante, agora é Marchese que relata, no Facebook, denuncia contra Mariucci sobre casas populares

  • Os papeis de protagonista e antagonista na Comissão Processante (CP) da Câmara de Maringá se inverteram nas redes sociais. O vereador Homero Marchese (PV) usou sua página no Facebook no último fim de semana (3 e 4/2) para denunciar o vereador Carlos Mariucci, presidente do PT de Maringá e relator da CP, por envolvimento com uma cooperativa de habitação investigada em inquérito civil público.

    Segundo as postagens de Marchese, em 2015 Mariucci trouxe à cidade a Cooperativa Habitacional Central do Brasil (Coohabras) e conseguiu a adesão de centenas de famílias de baixa renda, mediante pagamentos, em projeto para a construção de moradias populares a preço de custo e “nada foi feito”. “É crível supor que Mariucci se aproveitou eleitoralmente (2016) desse trabalho”, observou o denunciante, que na CP é o denunciado.

    De acordo com Marchese, para aderir à Coohabras, no final de 2017 o interessado tinha que desembolsar R$ 675 de entrada (em maio de 2015 era R$ 600) e R$ 65 de taxa de administração mensal (no início era R$ 25). Cerca de 2,5 mil pessoas aderiram ao projeto e “600 permanecem ativas”, segundo disse Mariucci em entrevista à Rádio Jovem Pan na sexta-feira (2/2) que precedeu as postagens do adversário. Veja a entrevista:

    “Uma conta conservadora – escreveu Marchese – indica que mais de R$ 2 milhões já podem ter sido arrecadados na cidade. Até agora, no entanto, a entidade não entregou aos cooperados terreno nenhum, nem moradia alguma. Sentindo-se enganados, muitas famílias desistiram do negócio, mas foram surpreendidas pela notícia de que a cooperativa não lhes devolveria os valores pagos”.

    Cooperativa solidária foi criada em São Paulo

    Mariucci conheceu a Coohabras, que nasceu em São Paulo em 2010, no Rio Grande do Sul. Por meio de parceira com a Associação de Reflexão e Ação Social (Aras), entidade ligada a Igreja Católica e então presidida pelo vereador, ele trouxe a cooperativa para Maringá. Em 2016, a mesma denúncia chegou, por e-mail anônimo, ao Ministério Público Federal, que a encaminhou à Promotoria de Defesa do Consumidor do Paraná local.

    Esse inquérito foi arquivado pelo promotor Maurício Kalache em 27 de março de 2017, por “não haver indícios de lesão a direitos individuais”. Ouvido pelo Ministério Público (MP), Mariucci declarou que um terreno de 5 alqueires paulistas estava sendo negociado pela Aras/Coohabras, onde se pretendia construir o Conjunto Habitacional Popular, com mil unidades habitacionais.

    As moradias, disse Mariucci ao promotor, dependiam de financiamento da Caixa Econômica Federal (CEF) pelo Programa Minha Casa Minha Vida. Ele apresentou vários documentos, entre os quais Ato de Constituição da Coohabras, Estatuto Social, atas de assembleias e um Instrumento Particular de Opção de Compra e Venda da área onde as moradias seriam feitas. As entregas das chaves seriam em 2018 e 2019.

    Denúncia chega ao MP e envolve a prefeitura

    No entanto, a denúncia ressurgiu no dia 15 de dezembro de 2017, por meio de queixas de cooperados que querem a devolução do dinheiro gasto por se sentirem prejudicados. Eles estão sendo defendidos pela advogada Cássia Franzoi, do Observatório Patriotas. Desta vez, a notícia de fato foi protocolada na Promotoria de Proteção ao Patrimônio Público, sob o número 0088.17.007436-8 e o inquérito civil público foi instaurado nesta terça-feira (6/2).

    “Entregamos ao promotor Leonardo Vilhena a documentação de quatro pessoas, mas hoje já temos dez procurações”, afirmou. Cássia optou por recorrer à Proteção do Patrimônio Público porque, conforme mostra notícia publicada no dia 3 de maio de 2017, no site da Prefeitura de Maringá, o prefeito Ulisses Maia assinou termo de parceira com a Aras, Coohabras e União Estadual por Moradia Popular para doação de terreno.

    “Esse projeto é para construção de 162 moradias. A contrapartida do Executivo é a doação do terreno. A área a ser destinada tem 11.344 m² e está dentro da Zona Especial de Interesse Social (ZEIS). Serão edificadas torres, sendo em cada torre um pavimento térreo e mais três andares. Em cada andar serão dispostos seis apartamentos”, diz o texto publicado, informando que o contrato foi assinado na Superintendência Regional da Caixa Econômica Federal (CEF).

    A matéria publicada pela prefeitura ressaltou que era  “a primeira vez na história de Maringá que a prefeitura e entidades firmavam parceira para construção de habitação de interesse social”. Mariucci, então presidente da ARAS, contou que as famílias a serem contempladas tinham sido previamente selecionadas. “A faixa de renda dessa proposta do Minha Casa Minha Vida é para famílias com renda mensal de até R$ 1,8 mil”, explicou o texto.

    O diretor de Habitação da prefeitura, o arquiteto e urbanista Márcio Lorin, disse na manhã desta quarta-feira (7/2) que o termo de intenção de alienação da área no Jardim Monique, que é uma ZEIS, foi assinado com a União Estadual por Moradia Popular junto ao Fundo de Desenvolvimento Social (FDS), do Ministério da Cidade, e está condicionado à aprovação do projeto pelo governo federal. “Está tudo absolutamente dentro da lei”, afirmou.

    Lorin disse que a Aras e a Coohabras não fazem são parte do termo de intenção de doação que foi assinado e que, caso o projeto da União Estadual por Moradia Popular seja aprovado, o convênio prevê que os contemplados sejam pessoas inscritas na fila por habitação da prefeitura. Nesta quinta-feira (8/2), o Ministério das Cidades deverá definir a data de divulgação dos projetos aprovados pelo FDS, que é especifico para entidades.

    Inquérito está na fase inicial das investigações

    O Ministério Público, além da advogada do Observatório Patriotas, ouviu uma pessoa arrolada como vítima, e o promotor Leonardo Vilhena instaurou o inquérito civil público. “As investigações ainda estão nos estágios iniciais e, depois de analisar os documentos e os fatos narrados, o doutor Leonardo entendeu que o caso é de competência desta promotoria especializada”, informou a assessoria do promotor.

    Cássia Franzoi é ligada ao grupo Patriotas, que já manifestou solidariedade a Marchese e se posicionou contra a cassação do vereador. Ela contou que recebeu a denúncia por meio da Ouvidoria Patriota e se interessou pelo caso, que está levando adiante voluntariamente. Os próximos passos, adiantou, “são os registros de Boletins de Ocorrências individuais e as  ações de ressarcimento integral de cada um, inclusive moral”. E foi questionada pela reportagem:

    – Doutora, a senhora disse que são pessoas humildes, de baixa renda e que algumas têm dificuldades até para se expressar, por isso não querem dar entrevista neste momento. Então como se explica o fato de procurarem o Observatório dos Patriotas pela internet e não a polícia, como, é de supor, normalmente fariam?

    – Que pergunta estranha essa… Acho que é mais fácil escrever na internet do que ir na polícia, mas o senhor terá oportunidade de perguntar isso para eles. Eu não sou juíza e você também não. O julgamento será feito pelo Judiciário, que vai enquadrar os crimes, se assim entender. O importante é que os fatos ocorreram e na minha opinião prejudicou muita gente humilde, de baixa renda, que acreditou na promessa de moradia a baixo custo.

    Comissão Processante faz parte do contexto

    Marchese tem se encarregado de amplificar a história, reproduzindo nas mídias sociais um vídeo anônimo que denuncia a Aras/Coohabras e escrevendo sobre “As Casas de Mariucci”. O detalhe que apimenta o contexto político da história é que Mariucci é o relator da CP que apura a denúncia que pode levar à cassação do mandato de Marchese. O processo está suspenso por liminar do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR).

    Mariucci disse na tarde desta terça-feira que se sente “muito à vontade para falar da  Coohabras” e que fará isso no “momento certo”. Por enquanto prefere não conceder novas entrevistas, “para não dar corda ao vereador, que tem como objetivo meu impedimento na  Comissão Processante, para o relatório não ser concluído”. Acrescentou que o trabalho na cooperativa é voluntário e que visa a ajudar a resolver o problema da falta de moradia.

    • Primeira atualização foi feita às 17 horas desta quarta-feira (7/2/2018), com a inclusão da informação que a notícia de fato havia provocado a instauração de inquérito civil público.

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