Pressão social contra portaria de trabalho escravo faz Temer recuar e admitir alterações

  • Na segunda-feira (16) o Ministério do Trabalho publicou uma portaria que, na opinião de organizações internacionais e servidores do próprio ministério, dificulta a fiscalização e o combate ao trabalho escravo.

    Em protesto, na quarta-feira (18) auditores fiscais do trabalho cruzaram os braços em vários Estados. Na quinta-feira (19), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge entregou, pessoalmente, um pedido de revogação da portaria ao ministro Ronaldo Nogueira (PTB).

    Nesta sexta-feira (20), foi tornado público que o presidente Michel Temer já passou a admitir uma revisão na portaria, que em Maringá desagradou fiscais do trabalho e especialistas do Direito do Trabalho.

    Em Maringá, os auditores fiscais da Delegacia Regional Ministério do Trabalho e Emprego, embora permaneçam com suas atividades normais, já que não há um grupo especial para fiscalizar o trabalho escravo, fazem críticas às novas regras.

    O chefe substituto da fiscalização do trabalho, Paulo Ricardo Vijande Pedrozo, disse que “são apenas nove auditores para fiscalizar 105 municípios da região, o que sobrecarrega os servidores e prejudica as fiscalizações. O número é muito baixo, mas situações de trabalho escravo não são comuns na região”.

    Um dos pontos da portaria é a necessidade de um Boletim de Ocorrência  ou seja, a fiscalização deve ser acompanhada de uma autoridade policial. Para Pedrozo, a presença de um policial vai dificultar ainda mais os trabalhos dos fiscais.

    “Os auditores fiscais têm a liberdade de fazer a fiscalização conforme a necessidade, e não precisa depender da disponibilidade de outro órgão. Se não tiver o delegado disponível na hora não pode fazer [a fiscalização], e quando finalmente tem o delegado disponível lá não tem mais a ocorrência”, afirmou.

    Especialistas criticam medida

    Para o advogado trabalhista César Eduardo Misael de Andrade, a portaria “limitou a forma como os fiscais e agentes vão interpretar uma determinada situação”. Segundo ele, “essa regulamentação se limitou a impedir o cerceamento de liberdade, o direito de ir e vir do empregado”.

    O advogado maringaense analisa que a portaria deveria ser melhor estudada e que neste momento não é oportuno realizar essa discussão, “principalmente quando estamos na eminência de uma reforma trabalhista que tem sido injustamente criticada”, destacou.

    Na interpretação de Misael a portaria não fere a Constituição ou o Código Penal. Ele acredita que “o trabalho escravo deve ser violentamente reprimido, porém é preciso de alguns critérios objetivos para a caracterização. Não da forma como foi posto nesta portaria”. 

    Rodrigo Pedro Casteleira, mestre em Ciências Sociais acredita que a portaria representa um retrocesso na luta em defesa dos direitos dos trabalhadores. “Ainda que a lei não diga, ainda que não haja uma definição, ela acaba abrindo muitas brechas para que o trabalho escravo se efetive”, entende ele.

    Para Casteleira, alguns setores sociais e a bancada ruralista acabam apoiando dispositivos institucionais que vão contra o combate ao trabalho escravo, para que a legislação se torne menos rígida. “Existem dentro da bancada os interesses e é muito mais fácil para eles explorarem. Com a portaria já esta cada vez mais havendo essa possibilidade.”

    Principais pontos da portaria

    A portaria diz que para identificação de trabalho escravo é necessário ocorrer a privação do direito de ir e vir. Segundo o documento, mesmo que o trabalhador esteja sujeito a condições degradantes, se o direito dele de ir e vir estiver mantido, o caso não poderá se encaixar na condição de trabalho escravo.

    Outro ponto que chama atenção é que a portaria deixa nas mãos do Ministro do Trabalho, a responsabilidade da chamada “lista de suja”. Essa lista divulga o nome de empresas que foram pegas em fiscalizações por trabalho escravo – atualmente é feita por um departamento técnico específico.

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