Da intenção à ação: Práticas eficazes da alta liderança para construir confiança

O erro de muitas lideranças é tratar a confiança como uma variável controlável, como se bastasse aplicar um conjunto de ações pontuais para garanti-la.

  • Tempo estimado de leitura: 6 minutos

    A confiança, dentro de uma organização, não é um elemento isolado ou um programa de curto prazo. Ela é um fenômeno sistêmico, emergente da interação contínua entre pessoas, processos, cultura, liderança e ambiente externo. Sob a ótica do Pensamento Sistêmico Complexo Organizacional, a confiança é vista como um ativo relacional que se constrói no fluxo das relações diárias, sendo fortemente influenciada pela coerência e pela interdependência entre todas as partes da organização.

    O grande erro de muitas lideranças é tratar a confiança como uma variável controlável, como se bastasse aplicar um conjunto de ações pontuais para garanti-la. No entanto, em sistemas complexos, como as empresas, o comportamento das pessoas é moldado não apenas pelo que é dito ou feito em momentos formais, mas, sobretudo, pelas microinterações cotidianas, pelos símbolos, pelas histórias que circulam nos corredores e pelas contradições percebidas entre o discurso e a prática.

    Nesse sentido, uma liderança que compreende o Pensamento Sistêmico Complexo sabe que confiança não nasce em uma área específica ou em uma iniciativa isolada da alta gestão. Ela é atravessada por uma teia de fatores: a forma como a empresa lida com erros, como os processos de tomada de decisão são conduzidos, como a comunicação flui entre áreas, como as metas são estabelecidas e até mesmo como as pessoas são promovidas ou desligadas. Cada uma dessas ações, por menor que pareça, emite sinais claros sobre quais são as regras do jogo e são esses sinais que constroem ou destroem confiança.

    A transparência, por exemplo, quando analisada de forma sistêmica, não é apenas sobre compartilhar informações com clareza, mas sim sobre a qualidade da informação que circula, quem tem acesso a ela, qual o tempo de resposta às perguntas críticas e qual o nível de autonomia real que cada colaborador sente para questionar ou sugerir melhorias. Transparência não é uma declaração de valor, é uma prática relacional que só se sustenta quando todas as partes entendem que fazem parte de um mesmo sistema interdependente.

    Outro ponto fundamental é a coerência, que no Pensamento Sistêmico Complexo Organizacional, é vista como a capacidade de gerar estabilidade e previsibilidade no ambiente sem engessar o sistema. Uma liderança coerente não é aquela que tem respostas prontas para tudo, mas aquela que é previsível em seus valores e reações, mesmo diante de cenários incertos. O colaborador não precisa adivinhar se hoje o seu erro será tratado com aprendizado ou punição ele sabe, porque o sistema como um todo dá sinais consistentes sobre como o erro é encarado dentro daquela cultura.

    A segurança psicológica, tão essencial para a construção da confiança, também é uma propriedade emergente nesse contexto. Ela não nasce de um programa de bem-estar ou de uma ação pontual de endomarketing, mas da forma como a liderança reage às vulnerabilidades que emergem dentro do sistema. Quando um colaborador expõe um erro, questiona uma decisão ou compartilha uma ideia ousada, a resposta da liderança reverbera em todo o sistema. Se a reação é de punição ou indiferença, a mensagem que se instala é que o sistema não é seguro e a confiança se dissolve.

    Inclusive, é essencial reconhecer que a confiança se espalha ou se retrai conforme a empresa lida com suas fronteiras com fornecedores, clientes e com a própria sociedade. Em um mundo conectado, onde as empresas são cada vez mais ecossistemas abertos, a forma como a organização interage com seus stakeholders externos impacta diretamente na forma como as pessoas dentro da empresa percebem sua cultura. Uma liderança que age de forma ética e transparente com parceiros e comunidade está enviando sinais poderosos para dentro da organização, reforçando a confiança interna.

    Portanto, construir confiança sob a ótica do Pensamento Sistêmico Complexo Organizacional é entender que confiança não é um departamento, não é um valor na parede, nem uma campanha de clima organizacional. Confiança é uma propriedade emergente da forma como todo o sistema se comporta no dia a dia, em todas as suas camadas de interação. Líderes que entendem isso deixam de buscar receitas prontas e passam a se dedicar à leitura constante dos sinais que emergem das relações dentro da empresa. Compreendem que não se trata apenas do que eles fazem diretamente, mas do efeito em cadeia que suas escolhas geram, e da capacidade de influenciar a dinâmica do sistema como um todo.

    No final, confiança é o reflexo da maturidade sistêmica de uma organização. Empresas que constroem confiança genuína são aquelas que entendem suas interdependências, cultivam coerência e transparência como práticas diárias, valorizam a escuta ativa e compreendem que toda decisão local reverbera globalmente no sistema.

    E é essa consciência sistêmica que diferencia as lideranças que constroem legados sustentáveis daquelas que apenas apagam incêndios e reagem aos problemas de forma isolada.

    Quando a alta liderança realmente compreende a empresa como um sistema vivo, complexo e interligado, a confiança deixa de ser uma meta e passa a ser uma consequência natural de uma cultura sólida, coerente e adaptável. Esse é o verdadeiro segredo das organizações que atravessam décadas e permanecem relevantes: elas compreendem que a confiança é construída todos os dias, em cada conversa, em cada decisão e em cada interação dentro e fora da empresa.

    Image 121

    Siga J. Rodolfo Grou no Instagram:
    @jrodolfogrouoficial

    Comentários estão fechados.