A Assembleia Legislativa do Paraná aprovou em segundo turno de votação, na sessão plenária desta terça-feira, 14, a proposta que institui as diretrizes do ensino domiciliar no âmbito da educação básica. O projeto de lei 179/2021, assinado por 35 deputados, avançou após receber 38 votos favoráveis e oito contrários.
O projeto determina a admissão do ensino domiciliar, sob o encargo dos pais ou responsáveis, observando a articulação, supervisão e avaliação periódica da aprendizagem por órgãos de ensino. A prática não é obrigatória. Os pais poderão optar entre o ensino escolar ou o domiciliar, a opção deverá ser comunicada a um órgão competente definido pelo Poder Executivo por meio de um formulário específico.
A matéria determina ainda que as famílias que optarem pelo ensino domiciliar deverão manter registros atualizados das atividades pedagógicas desenvolvidas, além de apresentá-las às autoridades competentes. Mesmo com o ensino domiciliar, crianças e adolescentes matriculadas no regime serão avaliadas por meio de provas institucionais aplicadas pelo sistema público de ensino.
O texto passou com duas das quatro emendas de plenário apresentadas por parlamentares. Entre elas está a assinada pela deputada Mabel Canto (PSC), determinando que a convivência comunitária do aluno em ensino domiciliar deverá ser garantida pelos pais ou responsáveis mediante comprovação de participação do estudante em atividade extracurricular em ambiente social e coletivo, com carga horária mínima de 8 horas mensais.
A segunda emenda, apresentada pelo deputado Evandro Araújo (PSC), veda a opção pela educação domiciliar aos pais ou responsáveis condenados por crimes hediondos e relacionados à violência doméstica e familiar, e às drogas ilícitas.
Encaminhamentos
O deputado Marcio Pacheco (PDT), um dos autores da proposta, destaca que é preciso atender o direito dos pais que optam pelo método homeschooling para a educação dos seus filhos. “Até o momento não há uma regulamentação do ensino domiciliar no Brasil. Mas o Superior Tribunal Federal já declarou a modalidade constitucional, mas que falta é regulamentação. Nós defendemos o direito de os pais decidirem que os filhos continuem a frequentar a escola. Mas defendemos também as famílias que querem um ensino de qualidade nas próprias casas. É esse direito que defendemos com esse projeto. A proposta estabelece regras, sim, justamente para permitir a regulamentação”, disse o deputado. “Uma conquista imensa para as famílias que buscavam esse direito, poder escolher como querem e onde querem que seus filhos estudem, sem ter qualquer tipo de perseguição por não haver regulamentação deste tema. É isto que estamos fazendo aqui no Paraná, garantia de direitos”, completou.
“Eu tenho dois filhos e quero que eles frequentem a escola. É fundamental que eles convivam com outras crianças. Também não me sinto apto para ensinar meus filhos. Mas não posso tirar o direito de quem se sente apto para educar seus filhos”, corroborou o deputado Homero Marchese (PROS). “A escola é um ambiente de aprendizado. No entanto, esse direito, essa liberdade individual, precisa ser concedido a essas famílias que querem educar seus filhos dentro de suas casas”, complementou o deputado Evandro Araújo.
O líder da Oposição na Casa, deputado Professor Lemos (PT), afirmou que a matéria, além de inconstitucional, não é de interesse público. “É uma proposta genérica e que dará prejuízo aos nossos estudantes. Podem citar exemplos de países com ensino domiciliar. Mas é preciso observar que eles têm critérios e os alunos são vinculados às escolas. Não é algo solto, como é esse projeto. Claro que existem exceções, mas elas existem com crianças vinculadas à escola. Essa proposta fere a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e o Estatuto da Criança e do Adolescente. É inconstitucional. Vamos à Justiça buscar a nulidade dessa lei”, declarou o líder da Oposição na Casa, deputado Professor Lemos (PT). “Uma proposta como esta foi aprovada em Cascavel no ano passado pela Câmara dos Vereadores. Eu levei o caso ao Tribunal de Justiça, que decidiu por unanimidade que a lei é ilegal e inconstitucional. O argumento é que apenas o Congresso pode alterar a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), que deriva da Constituição Federal. A LDB não pode ser alterada por lei estadual nem lei municipal”, reforçou.
“Além do afastamento das crianças do ambiente escolar, temos a preocupação de que hoje as escolas são um dos poucos espaços que os estudantes encontram abrigo quando são agredidos em casas. A partir do momento que as crianças não tenham esse atendimento por parte da escola, teremos graves problemas”, complementou o deputado Tadeu Veneri (PT).
Estatísticas
Conforme levantamento realizado, em 2019, pela Associação Nacional de Ensino Domiciliar (ANED) mais de 18.000 estudantes realizam os seus estudos em casa, sendo o método aplicado em 27 estados da federação. Hoje, a ANED estima que no Paraná mais de 3 mil famílias praticam o ensino domiciliar sem nenhuma regulamentação e segurança jurídica.
Para Ismar Amaral Pereira, representante da ANED no Paraná (ANED-PR), com esse projeto o Paraná assume a vanguarda na liberdade educacional alcançando destaque no Brasil igualando-se às nações mais avançadas no mundo. “Somos milhares de famílias que estamos por meio deste Projeto de Lei saindo de um limbo jurídico e deixando de sermos tratados como criminosos”, afirma entusiasmado.
Para Cibele Scandelari, mãe praticante do ensino domiciliar, a regulamentação homeschooling representa a tranquilidade em poder exercer um direito. “Eu não ficarei mais temerosa e estar cuidando pessoalmente da educação das minhas filhas. Abri mão dos holofotes da vida profissional para me dedicar ao crescimento e ao desenvolvimento delas. A regulamentação traz para os pais que praticam o ensino domiciliar o respaldo jurídico e a garantia do direito de escolha”, enfatiza Cibele.
Sobre o Homeschooling
No homeschooling a responsabilidade pela educação formal dos filhos é atribuída aos pais, responsáveis ou professores contratados e prevê supervisão e avaliação periódica pelos órgãos próprios dos sistemas de ensino.
Esse formato de ensino surgiu nos Estados Unidos na década de 70 e hoje está presente em mais de 60 países. A modalidade é válida por exemplo nos EUA, Canadá, França, Itália, Reino Unido, Suíça, Portugal, Holanda, Áustria, Finlândia, Noruega, Rússia Bélgica, África do Sul, Filipinas, Japão, Austrália, Nova Zelândia. Na América Latina o ensino domiciliar é regulamentado na Colômbia, Chile, Equador e Paraguai.
Segundo informações do Datasenado, instituto de pesquisa vinculado ao Senado Federal, em pesquisa realizada em 2020, as razões que levaram famílias a optarem por este modelo de ensino destacam-se: prática do bullying com 77%, vontade de aumentar a presença da família em casa com 63% e 25% pelo aumento na qualidade do ensino.
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