Por Ricardo Magatti
Um dos torcedores do São Paulo acusado de racismo prestou depoimento à polícia nesta segunda-feira. Ricardo Pereira Fernandes, de 44 anos, negou ter imitado um macaco e alegou que seu gesto, naquele momento, fazia alusão ao personagem Hulk, super-herói da Marvel. Ele disse que fez aquele movimento, registrado em vídeo que circula nas redes sociais, para provocar um torcedor do Fluminense forte, ou, nas palavras dele, um “bombadão”.
“O gesto que faço ali é do Hulk, não de macaco. Estava me referindo a um cara ‘bombadão’ da torcida deles, não ao cara que gravou o vídeo. Eles chegaram lá, começou a provocação e fiz isso numa boa”, afirmou o torcedor são-paulino, ao Estadão.
A reportagem também falou com Gabriel Brandão, de 26 anos, o torcedor que acusa Ricardo de ter emulado um macaco. O torcedor, que é motorista de aplicativo, reiterou sua acusação. Ele gravou e publicou o vídeo para mostrar o são-paulino fazendo os acenos que considera racista em direção ao setor de visitante do Morumbi, onde estavam os apoiadores do Fluminense.
“Realmente havia um cara forte do meu lado. Mas ele aponta pra mim e faz o gesto. O gesto de força é quando você levanta o braço. O gesto que ele fez é de macaco. Não fui só eu que vi. Eu me senti ofendido. Ele fez várias vezes e eu filmei”, enfatizou Gabriel, que não registrou um boletim de ocorrência, mas pretende processar Ricardo.
“Agora vai ser na Justiça. Só a Justiça vai dizer se ele estava fazendo gesto de força ou de macaco”.
Em maio passado, o Senado aprovou projeto de lei que amplia as penas por crime de injúria racial em eventos esportivos. Atualmente, o Código Penal prevê de um a três anos de detenção. O texto do PL 4.566/2021 pede aumento da pena para dois a cinco anos. O projeto aguarda para ser apreciado de novo na Câmara.
Ricardo contou estar “aliviado” depois de ter prestado depoimento no 34º Distrito Policial da Vila Sônia, na zona Sul de São Paulo e relatou que teve de excluir seu perfil em uma rede social em virtude das ameaças que vinha recebendo. “Um grupo de torcedores disse que ia me caçar e que eu ia sofrer as consequências”.
Gabriel, por outro lado, repetiu que Ricardo fez o gesto que considera racista “várias vezes” e relatou que o episódio no qual acusa o são-paulino de racismo afetou consideravelmente a sua vida.
“A gente vê na televisão, mas nunca tinha visto de frente”, revelou. “Me assustei um pouco, me fez pensar em algumas coisas, mas graças a Deus tenho meu caráter, minha índole, minha família, meus amigos. Agradeço a torcida do São Paulo, do Fluminense e de todos que me mandaram mensagens”.
Um torcedor do Fluminense, da torcida Young Flu de São Paulo, se pronunciou no Instagram sobre o episódio envolvendo Ricardo. Ele afirmou ter visto de perto a cena e corroborou o que disse o são-paulino a respeito do episódio.
“Em nenhum momento, ele fez qualquer ato de racismo. Quando a gente estava discutindo, passou um cara atrás de mim, mais branco que eu. Esse rapaz de camisa preta apontou para mim e para o outro e fez um gesto, forçando a barriga e colocou a mão por baixo (da camisa) em alusão ao sobrepreso dele. Falo com convicção porque ele fez isso mais de uma vez. Pediram pra ele fazer de novo e ele, na inocência, fez de novo o gesto”, relatou
INVESTIGAÇÃO
Mais cedo, a Polícia Civil já havia instaurado inquérito policial por injúria racial contra Ricardo e outro torcedor do São Paulo por gestos considerados racistas registrados em vídeos que se tornaram virais nas redes sociais.
Em um deles, um homem de camisa vermelha faz claros acenos de macaco em direção a torcedores do Fluminense. Em outro vídeo, é possível ver que Ricardo veste uma camisa preta que diz ser em homenagem ao ídolo negro Leônidas da Silva. Logo em seguida, aproximam-se alguns policiais militares, que entenderam que o são-paulino não havia imitado um macaco.
“Ali, na hora, tinham quatro policiais da tropa de Choque. O policial viu o vídeo e disse que eu não estava fazendo gesto racista. Eu não fui preso. Não teve flagrante porque não houve ato racista. Eu continuei no mesmo lugar normalmente até o fim do jogo”, comentou Ricardo.
“Conversei com o presidente do São Paulo (Julio Casares), que disse que os dois serão punidos pelo clube”, disse o delegado Cesar Saad, da Delegaria de Repressão a Crimes de Intolerância Esportiva (Drade), ao Estadão. A polícia também tenta contato com o torcedor do Fluminense que denunciou o caso.
O São Paulo informou que abriu dois boletins de ocorrência contra os torcedores que praticaram atos de racismo e confirmou que tem colaborado com as autoridades para a investigação dos casos.
“O São Paulo Futebol Clube lamenta as manifestações de racismo contra um torcedor do Fluminense ocorridas na partida desta tarde no Estádio do Morumbi e as repudia com veemência. O Tricolor reafirma que é contra todo tipo de discriminação, repudia qualquer forma de ofensa de cunho racial e se coloca à disposição das autoridades para apurar os fatos e ajudar a identificar o agressor. O São Paulo Futebol Clube é de todos, e no Morumbi não há espaço para racismo. Racistas não são bem-vindos”.
O Fluminense também condenou os episódios e se colocou à disposição do seu torcedor que denunciou um dos episódios.
“O Fluminense Football Club tomou conhecimento, através da manifestação de um de seus torcedores em rede social, de uma grave denúncia de ofensa de cunho racial sofrida nas arquibancadas do Morumbi na partida de hoje entre São Paulo x Fluminense. O clube declara estar à disposição do seu torcedor e repudia severamente qualquer ato discriminatório, solicitando celeridade das autoridades na investigação do caso. O preconceito precisa ser erradicado de todos os ambientes da sociedade, inclusive do Futebol”.
A partida entre São Paulo e Fluminense terminou empatada em 2 a 2. Mais de 47 mil torcedores compareceram ao estádio do Morumbi, que também contou com ótima presença no setor visitante, destinado à torcida do Fluminense neste domingo.
Estadão Conteúdo / Imagem: Reprodução de nota do SPFC
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