A flexibilização do trabalho é uma “faca de dois gumes”

No segundo artigo da série “Observatório das Metrópoles nas Eleições”, uma parceria do Maringá Post com o o núcleo maringaense do Observatório das Metrópoles, vinculado à Universidade Estadual de Maringá (UEM), a Socióloga Samanta Martinelli fala sobre o agravamento das desigualdades sociais, ocasionado pela flexibilização das relações de trabalho.

  • No segundo artigo da série “Observatório das Metrópoles nas Eleições”, uma parceria do Maringá Post com o o núcleo maringaense do Observatório das Metrópoles, vinculado à Universidade Estadual de Maringá (UEM), a Socióloga Samanta Martinelli fala sobre o agravamento das desigualdades sociais, ocasionado pela flexibilização das relações de trabalho.

    A flexibilização do trabalho é uma “faca de dois gumes”

    Por Samanta Martinelli**

    Em grande parte do tempo nossa vivencia se dá por meio do trabalho, sendo assim a cidade deveria ser o lugar da classe trabalhadora que tudo produz. No entanto, isso depende da maneira como a cidade é planejada, de acordo com sua ideologia urbanística, que inclui as visões sobre como as cidades devem ser organizadas, quais tipos de espaços públicos são prioritários, como deve ocorrer o uso do solo, e quais são os objetivos gerais para o crescimento e a evolução da cidade.

    Fato é que no tempo presente vivemos sob o fenômeno global da acumulação flexível, que representa uma flexibilização dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo, permitindo assim novas modalidades de trabalhos flexíveis no meio urbano.

    A flexibilização é uma “faca de dois gumes”, por um lado, oferece uma abordagem mais livre para garantir o sustento diário, mas, por outro lado, está se transformando em sinônimo de precariedade. Essa contradição é motivo de preocupação à medida que as desigualdades sociais se intensificam.

    Um caminho sem volta

    O trabalho flexível obteve uma maior relevância com a experiência da pandemia, onde ajustes rápidos possibilitaram a adoção de diferentes formas de organizar e realizar o trabalho, explicitadas nos teletrabalhos, no homeoffice, na uberização e o no micro empreendedorismo. Revelou um fato concreto: as gerações mais recentes de trabalhadores não se adaptam à rigidez, ao controle excessivo de horários, a remunerações mínimas e a uma gestão autoritária.

    A liberdade é uma palavra encantadora, poderosa na pós-modernidade. Talvez não desejemos mais dedicar toda uma vida a um único trabalho. É o milagre da flexibilização que nos veste muito bem. No entanto, o perigo surge quando essa dinâmica se acomoda e encontra significado na precariedade, onde o elo perigoso deste processo se faz quando ela encontra acomodação e sentido na precariedade, já que a obrigatoriedade dos direitos trabalhistas não constitui as novas formas ocupacionais que ela abrange. Sendo assim, as condições da informalidade são aceitas.

    É preciso pensar nas formas de implementação dos direitos trabalhistas nas novas formas de trabalho, buscando garantir proteção e alguma estabilidade, sem criar encargos excessivos para a natureza do trabalho flexível. Na figura jurídica do micro empreendedorismo individual observamos um caminhar progressivo para o asseguramento de direitos com certa liberdade de empreender. Já na Uberização temos maiores desafios, pois envolve uma diversidade significativa de motoristas de aplicativos.

    O Brasil tem em torno de 2 milhões trabalhadores plataformizados que representam 1,7% da população ocupada. A cidade de Curitiba com população de 1.773.733 (IBGE 2022), possui em torno de 12 mil motoristas de aplicativos, segundo dados não oficiais de entidades que representam a categoria.

    Visualizando este cenário é perceptível e necessária a realização de pesquisas que captem informações precisas sobre estes trabalhadores flexíveis, para que tenhamos dados representativos dessa classe ocupacional que não só impacta a relação do trabalho e renda na cidade de Maringá, mas altera a dinâmica de mobilidade urbana.
    No nível local, é perceptível a vulnerabilidade de entregadores em motos e bicicletas em um trânsito agressivo e pouco adequado a esse tipo de transporte. Cabe à gestão municipal a implementação de ações em favor da melhoria da qualidade de vida desses trabalhadores urbanos, que estão por sua conta própria, expostos aos riscos diários.

    ** Sobre a autora: Samanta Martinelli é Socióloga, Mestre em Sociologia na linha de pesquisa Trabalho e Sociedade pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Atuante nas temáticas sobre flexibilização produtiva, terceirizações e microempreendedorismo individual, também é Professora no ensino médio e superior. Atualmente, é Pesquisadora no Observatório das Metrópoles de Maringá, no eixo trabalho e cidade.

    Foto: Ilustrativa/Rovena Rosa/Agência Brasil | Domínio Público

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