A Resistência ao Nazismo no U.S. Open

O atleta alemão Alexander Zverev fez um ato de resistência contra o nazismo e demonstrou a importância de conhecer a própria história.

  • Por Caio Henrique Lopes Ramiro

    Na data de ontem (05/09) ocorreu um episódio de resistência à brutalidade nazista no torneio de tênis mais famoso dos Estados Unidos da América.

    Na partida entre Alexander Zverev e Jannik Sinner ecoou da torcida uma frase utilizada pelo aparato militar nazista e Adolf Hitler, a saber: “Alemanha, Alemanha acima de tudo”.  Ao ouvir a frase, o atleta alemão Alexander Zverev imediatamente ofertou resistência, comunicando o árbitro do ocorrido e paralisando a partida.

    Zverev ao pedir providências ao juiz da partida afirmou que “ele disse a frase mais famosa de Hitler. Isso é inaceitável”. Esta frase, na realidade, foi apropriada pelos nazistas, pois ela faz parte do hino alemão confeccionado por August Heinrich Hoffmann von Fallersleben, em 1841.

    Não obstante, após os horrores das práticas nazistas e de seus campos de extermínio com o fim da segunda guerra mundial a estrofe entoada pelo nazista na arquibancada foi retirada do hino alemão, bem como outros trechos, permanecendo em uso a terceira estrofe da canção original e que diz respeito a unidade, justiça e liberdade.

    Em que pese à apropriação feita pelo nazista da arquibancada, importa considerar que a luta contra o fascismo e o nazismo continua exigindo atenção de todos e todas aqueles que buscam alguma convivência em comum, com respeito à diferença.

    Neste sentido, a atitude de Alexander Zverev ao afirmar que aquela atitude é inaceitável se apresenta como verdadeiro ato de resistência e de respeito àqueles que sucumbiram na luta para impor a derrota militar ao nazismo (1933-1945).

    Neste sentido, verifica-se na postura de Zverev uma dimensão ética, uma vez que o atleta alemão afirmou que entoar este hino configurou uma falta de respeito e, além disso, “sou alemão e não temos orgulho desta parte de nossa história”. Por esta via, nota-se a importância do debate e o ganho do ponto de vista da tomada de consciência acerca dos acontecimentos que marcaram a história da Alemanha e do mundo. Desse modo, a resistência ofertada pelo atleta alemão nada tem a ver com silenciamento ou violação de direitos.

    A fim de ilustrar este ponto, vale considerar a polêmica ocasionada na Alemanha quando da concessão – pelos Cadernos de Política Alemã e Internacional -, do Prêmio de Democracia, no ano de 1997, a Daniel Goldhagen, tendo em vista a publicação do livro Os carrascos voluntários de Hitler (Hitlers willige Vollstrecker).

    Na ocasião os editores do periódico convidaram Jan Phillipp Reemstma e Jürgen Habermas para um pronunciamento. A hipótese geral de Goldhagen afirma que a questão do antissemitismo é algo anterior ao aparecimento dos nazistas como força política no cenário político alemão, desse modo, o genocídio nazi foi na realidade uma atitude que levou a efeito um sentimento arraigado na Alemanha.

    Esta afirmação fez com que muitos historiadores e estudiosos que se dedicavam a compreender o período nazista da história alemã se afastassem de Goldhagen, bem como, também, aguardassem o pronunciamento de Habermas. Em 10 de março de 1997 Habermas se pronuncia na edição de abril da revista Blätter.

    Para Habermas, há que se reconhecer o mérito do livro por dar importante contribuição à reflexão acerca do uso público correto da História. Logo, com a superação de uma perspectiva de enfrentamento entre o nacionalismo negativo e o êxodo da história, significa dizer, deve-se buscar superar neste debate o pontos de divergência que dizem respeito ao diagnóstico da negação que se apresenta como objeção ao argumento da responsabilização e moralização presunçosa.

    No entender de Habermas, nos discursos que têm no horizonte o auto entendimento – reflexões e debates que podem ser provocados por livros, filmes e séries, por exemplo -, o que está em jogo não é um ajuste de contas a curto prazo, mas, isto sim, uma meditação a sério acerca de formas desejáveis de convivência política e quais valores devem ter prioridade na comunidade política.

    Assim, trata-se de uma reflexão que coloca no horizonte a perspectiva do respeito mútuo entre cidadãos que atribuem direitos uns aos outros. Dessa forma, o acesso ao arquivo da História nacional se apresenta de fundamental importância, a fim de que se construa uma autocompreensão política aliada a tomada de consciência histórica, isto é, a autocompreensão dos cidadãos tem de ser afetada, uma vez que a história é parte de nós.

    Na atitude que resiste ao nazismo de Alexander Zverev, nota-se não só o acerto de Habermas, mas, também, da Alemanha, ao não retirar de seus cidadãos a possibilidade de acessar sua própria história, mesmo que a parte examinada seja sombria e motivo de vergonha.

    Foto: Reprodução / Instagram

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