Por Caio Henrique Lopes Ramiro
No último ensaio publicado nesta coluna a proposta foi meditar a respeito da permanência do fascismo, considerando o alerta de Umberto Eco acerca de sua eternidade (Ur-fascismo).
Algumas linhas antes, buscamos uma aproximação de Primo Levi, a fim de considerar o sentido de uma vida antifascista. Por esta via caminha o ensaio desta semana, contudo, com outra companheira de caminhada, a saber: Clara Zetkin (1857-1933).
Em primeiro lugar, algumas notas biográficas se apresentam como algo interessante. Não se admite, nem por hipótese, algo como uma biografia de Zetkin, mas, sim, uma aproximação, como a que foi feita com Levi, uma vez que o interessante é buscar a visão de uma vida antifascista, ou seja, uma radicalidade existencial.
Clara Zetkin nasceu no que hoje é a Alemanha e foi professora, jornalista e importante figura política, tendo, inclusive, uma militância dentro do período da República de Weimar. A conjuntura da Alemanha no período weimariano é bastante conflituosa e, ao mesmo tempo, rica do ponto de vista cultural.
Zetkin – amiga pessoal de Rosa Luxemburgo -, tem ativa militância político-partidária. Em um primeiro momento se filiou ao Partido Social Democrata (SPD) – partido de Olaf Scholz, atual chanceler alemão -, posteriormente (1916), com o advento do primeiro conflito planetário (1914-1918), incorpora como pauta de sua ação política a bandeira pacifista – inclusive com a organização do Socorro Vermelho Internacional -, o que implicou em diversas prisões por sua posição crítica a guerra.
Por esta via, Zetkin rompe com seu partido e se torna uma das fundadoras do Partido Social Democrata Independente Alemão (USPD). Em 1919, vincula-se as fileiras do Partido Comunista Alemão (KPD) e participa da revolução que institui a forma republicana na Alemanha, com a derrubada do império do Kaiser Guilherme II.
Em 1920, Clara Zetkin se torna deputada no Congresso da República de Weimar. No ano de 1923 publica o texto que completa cem anos no corrente ano de 2023, a saber: A luta contra o fascismo.
Trata-se de uma abordagem crítica e de um chamado que parece dizer muito ao nosso tempo, em especial para esclarecer pontos quanto a posição fascista no arco ideológico.
Neste sentido, importa considerar que dentro dos marcos ideológicos do século XX categorias como esquerda e direita têm um sentido mais claro e o fascismo se apresenta fortemente ligado ao lado direito do arco ideológico.
Não obstante, Zetkin afirma – em nítida posição que trabalha com a ideia de luta de classes (algo a se recuperar, talvez) -, que o proletariado é o inimigo excepcionalmente amedrontador dos fascistas, uma vez que estes últimos são a expressão mais forte e concentrada da burguesia mundial.
Neste sentido, é urgente que a classe trabalhadora tome consciência da urgente da tarefa de se colocar contra e derrubar o fascismo, pois se trata de “uma questão de sobrevivência para qualquer trabalhador, uma questão de acesso a pão, a condições de trabalho e qualidade de vida para milhões e milhões de explorados”.
Assim, no diagnóstico de Clara Zetkin houve muita confusão em torno da caracterização do fascismo. A primeira leitura do fenômeno histórico-político fascista foi a de que se tratava de terrorismo burguês.
Todavia, há uma significativa diferença e, em perspectiva histórica, o fascismo se apresenta, no entender de Zetkin, mais como uma punição ao proletariado pelo fato de não ter aprofundado e expandido o processo revolucionário russo de 1917.
Desse modo, o fascismo não é algo ligado unicamente a castas feudais de regimes aristocráticos, mas, isto sim, alcança amplas camadas sociais impactando, inclusive, o proletariado.
Logo, compreender as diferentes formas de apresentação dos fascistas é tarefa importante para que seja dado efetivo combate – fundamentalmente em perspectiva política e ideológica -, a este câncer que nos ameaça.
A luta continua…
Foto: Alamy Stock Photo
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