Por Caio Henrique Lopes Ramiro
No último ensaio publicado nesta coluna, recuperamos o tema do fascismo, a fim de meditar acerca da perspectiva de vitória nos pós guerra (1945) e o retorno desta força política.
É possível mesmo dialogar com o ensaio que apresentou a vida antifascista de Primo Levi, uma vez que este último nos provoca a estar atentos com a ameaça fascista que estava nas sombras e agora projeta sua sombra.
Nos últimos dias, em congresso de importante organização estudantil brasileira, um integrante da Corte Constitucional do Brasil e também professor de Direito Constitucional fez uma afirmação que se coloca em diálogo com as reflexões anteriormente expostas neste espaço.
A linha de pensamento ao qual se filia o importante jurista/juiz se coloca nos trilhos do projeto das Luzes, haja vista que alguns anos atrás publicou interessante artigo em que afirmava o papel contra majoritário dos tribunais constitucionais e, por conseguinte, do Supremo Tribunal Federal.
Neste sentido, um tribunal teria não só a potência como a tarefa de “empurrar a história”, uma clara adesão a uma filosofia da história que dialoga com a ideia de progresso, tema que já foi examinado criticamente por Fernando Rodrigues de Almeida, em sua coluna, a saber: Direito, Política e Literatura.
Contudo, ao ser contestado por via de manifestações de protesto no congresso estudantil, o jurista/juiz afirma que foi imposta uma derrota ao movimento neofascista brasileiro. Na fala do magistrado ele utiliza outra nomenclatura, todavia, deixamos de lado a adaptação de nome de ex-presidente para que possamos tratar daquilo que realmente nos ameaça.
Neste horizonte de perspectiva, mostra-se importante ouvir o alerta de Umberto Eco, importante pensador italiano, muito conhecido em terras brasileiras por seu livro O nome da rosa, o qual recomendamos vivamente a leitura, bem como sua adaptação para o cinema.
Todavia, o eco de alerta de Umberto foi lançado em pequeno livro, resultado de um conferência pronunciada em simpósio organizado pelos departamentos de italiano e de francês da Universidade de Columbia, em 25 de abril de 1995, oportunidade em que chama a atenção para o caráter eterno do fascismo.
A hipótese de trabalho do pensador italiano é, ao que parece, a escuta do chamado de Primo Levi e um alerta para – falando com a poesia de Bertolt Brecht -, aqueles que virão depois de nós, a fim de que não se esqueçam – e nem tenham ilusões – de que o mal fascista está derrotado.
Notamos um esforço de caracterização do movimento político contemporâneo, conforme apresentado no texto da semana passada. No mais das vezes escutamos algo como neofascismo.
Umberto Eco afirma que o fascismo italiano foi o primeiro a criar um ritual litúrgico de culto ao militarismo, inclusive com um modo de vestir que obteve mais sucesso do que Armani, Benetton ou Versace.
Ainda, as alianças do fascismo se colocam para além das fileiras militares e se apresentam algo semelhantes em paragens outras que não as italianas, tendo em vista que seus serviços “revolucionários” são financiados por proprietários rurais conservadores em aliança com a classe dominante, no caso da Itália e do fascismo histórico, em consórcio com a família real.
Assim, para Umberto Eco, o termo fascismo é adaptável a tudo. Desse modo, retire o imperialismo e se encontram Franco (Espanha) e Salazar (Portugal); tirem o colonialismo e veremos Getúlio Vargas e o fascismo balcânico.
Ao acrescentarmos o misticismo do Graal e a mitologia celta teremos a vedete italiana do fascismo Julius Evola que, com uma pitada de fetiche pela idade média, permite-nos chegar a um já falecido semiletrado guru da astrologia de nacionalidade brasileira.
Em que pese as variantes, o eco de Umberto aponta para algumas características que permanecem, tais como: culto a tradição (não pode existir avanço do saber); recusa da modernidade; irracionalismo e culto da ação pela ação; consenso pelo medo da diferença; apelo as classes médias frustradas; inimizade e humilhação; nacionalismo; mito do herói; vida como guerra permanente; obsessão da conspiração e o elitismo populista, em que o elemento popular ou povo não passa de uma ficção teatral e espetacular.
Diante da adaptabilidade, o pensador italiano, conforme já mencionado, chama a atenção para a eternidade do fascismo (Ur-fascismo), isto é, temos de estar atentos, pois o fascismo é eterno e ainda está ao nosso redor, muitas vezes em palacetes acarpetados e em trajes finos e civis.
Foto: Freepik
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