Pessoas em situação de rua denunciam maus-tratos e violência em centros de acolhimento

Segundo dados do governo, estão cadastradas no CadÚnico 203 mil pessoas em situação de rua e existem apenas 39 mil vagas de acolhimento.

  • Segundo dados do governo, estão cadastradas no CadÚnico 203 mil pessoas em situação de rua e existem apenas 39 mil vagas de acolhimento

    Representantes de pessoas em situação de rua denunciaram, em audiência da Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial da Câmara dos Deputados, que vêm recebendo um péssimo tratamento e sofrendo violências nos espaços públicos e dentro dos centros de acolhimento criados ou mantidos pelo estado.

    No debate, realizado nesta quarta-feira (21), os convidados concordaram que a moradia é o primeiro passo para que essas pessoas possam acessar outros direitos, como saúde, educação e emprego. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, estão cadastradas no CadÚnico 203 mil pessoas em situação de rua e existem apenas 39 mil vagas de acolhimento para essas pessoas.

    A representante do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, Joana Basílio, defendeu que o governo invista em moradias, em vez de apenas financiar centros de acolhimento.

    “A centralidade da política para a população em situação de rua está dentro da moradia primeiro, política de moradia é garantia de direitos humanos. Nós estamos em situação de rua, às vezes sujos, drogados, mas somos seres humanos. A gente quer direito a ter família, quer todos os direitos que a sociedade tem”, afirmou.

    A representante do Grupo de Trabalho sobre segurança alimentar e defesa das pessoas em situação de rua do Ministério Público do Ceará, Giovanna Araújo, destacou a intenção do governo em alterar o programa Minha Casa, Minha Vida para permitir a utilização de edifícios recuperados nos centros das cidades brasileiras como unidades habitacionais com aluguel social para grupos vulneráveis.

    Na avaliação dela, um dos problemas do programa habitacional é a periferização das moradias. Ela entende que o modelo de espraiar a cidade onera ainda mais o poder público, porque exige a construção de novos equipamentos públicos. “É importante que a gente perceba a necessidade ter essa moradia central, não apenas sob o prisma de que ali reside a rede de apoio das pessoas em situação de rua, mas porque ali já se tem uma infraestrutura consolidada”, afirmou.

    Acolhimento degradante
    A deputada Erika Hilton (Psol-SP) citou situação degradante que encontrou em uma diligência em centros de acolhimento de São Paulo, quando era vereadora na capital paulista. Ela lembrou que a população em situação de rua vem crescendo e que é preciso garantir empregabilidade para que essas pessoas possam deixar as ruas e acessar seus direitos. Acrescentou que políticas públicas só serão eficientes se elaboradas com a participação da população em situação de rua.

    “Pouco se discute os caminhos para a superar essa desumanização, que ultrapassa os momentos que nós estamos vivendo. É um problema estrutural calcado nas desigualdades, na ausência de oportunidades”, afirma. Ela destaca que muitas prefeituras entendem a situação de rua apenas como questão de zeladoria da cidade. “Como se estivéssemos falando de lixo, de entulho e não de seres humanos que precisam de emprego, de moradia, de oportunidade, de assistência e de emancipação”.

    Will Shutter / Câmara dos DeputadosAudiência Pública - Direitos da população em situação de rua. 

    Censo
    O representante do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Luciano Oliveira, lembrou que para a correta implementação dos programas sociais é preciso fazer um levantamento da população em situação de rua. Ele destacou que, para isso, o ministério está discutindo com o IBGE a realização de um censo desvinculado da amostragem por domicílio.

    “Iniciamos esse diálogo e foi criado um GT que vai ser coordenado pelo Ministério dos Direitos Humanos para identificar as metodologias do Censo para produção de registros, o apoio ao IBGE, e a análise dos dados dos domicílios improvisados do Censo de 2022. As pessoas que estavam em barracas foram recenseadas e o GT vai ajudar na análise”, afirmou.

    Ações higienistas
    A Associação Nacional do Defensores Públicos encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (Adin) sobre a violação do direitos da população que mora na rua. A representante da entidade, Fernanda Balera, explica que a ação considera diversos temas, como a necessidade de contagem dessas pessoas pelo IBGE e de que elas sejam priorizadas em políticas de moradia.

    “Além disso, é considerada a proibição de qualquer medida de arquitetura hostil e remoção forçada das pessoas em situação de rua, e a inconstitucionalidade da retirada de pertences”, explicou.

    O representante do Movimento Nacional da População de Rua, Daniel Paz, lamentou que essa população não tenha acesso a nenhum direito humano e seja alvo de ações higienistasrealizadas com frequência por órgãos de segurança pública.

    “Vem aquela mesma violência, a única política que funciona pra nós que é a política de segurança pública. E ela se junta a outras políticas que eram pra dar proteção, mas vão nos tirando os direitos, até de ser humano”, afirma.

    Foto: Reprodução / Creative Commons/ Fonte: Agência Câmara de Notícias

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