O primeiro caso semelhante ao vivido em Cambé nessa segunda-feira (19) havia ocorrido em 2018. Em todo Brasil, foram 24 ataques em escolas desde 2002, sendo 45% deles registrados desde agosto do ano passado.
Por Victor Ramalho
O ataque registrado no Colégio Estadual Helena Kolody, em Cambé, nessa segunda-feira (19), novamente levanta o debate sobre a segurança nos ambientes escolares. Historicamente, o Paraná não registra episódios de violência semelhantes, no entanto, este não é um caso isolado.
É a segunda vez que o Estado tem um atentado armado em escolas neste século. O primeiro episódio ocorreu em setembro de 2018, também em um Colégio Estadual, mas na cidade de Medianeira (a 60 quilômetros de Foz do Iguaçu).
Na ocasião, um adolescente de 15 anos entrou armado na instituição de ensino e atirou contra colegas de classe, deixando dois estudantes, um de 15 e outro de 18 anos, feridos. Apesar da gravidade do ferimento da primeira vítima – que foi atingida com um disparo nas costas -, ninguém morreu no atentado.
Após ser detido, o autor do ataque relatou aos policiais que vinha planejando o atentado desde julho daquele ano, após ser vítima de bullyng por parte de outros estudantes. Ele afirmava ter em mente 9 vítimas e, na casa dos pais do adolescente, a Polícia Militar (PM) localizou mais armas, munições e até bombas caseiras.
No caso do atentado registrado em Cambé nessa segunda-feira (19), a Polícia Militar também localizou com o suspeito, de 20 anos, anotações que remetem a outros atentados em escolas do país, com o de Suzano, em 2019.
“Ele foi localizado com várias anotações em que remetem a outros atentados, como o que ocorreu em Suzano. E no, meio dessas anotações, havia sim o planejamento de cometer o ato. Ele veio até o Colégio por volta das 9h15, com o pretexto de conseguir um histórico escolar. Depois, pediu para ir até o banheiro, lá ele trocou de roupa e saiu em posse de uma arma de fogo e efetuou vários disparos”, disse o secretário de Segurança Pública do Paraná, Hudson Teixeira, em entrevista coletiva nessa segunda-feira (19).
24 ataques no século, 11 desde agosto de 2022
Dentro do programa de pós-graduação em Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), um grupo de pesquisa dedica-se a mapear todos os casos de violência extrema ocorridos em escolas do Brasil desde 2000. Fundado em 2021, o grupo “Ética, Diversidade e Democracia na Escola Pública” identificou 22 ataques ocorridos nos últimos 23 anos.
O último levantamento realizado pela Unicamp e disponibilizado ao Maringá Post foi realizado antes do ataque em Blumenau-SC, ocorrido em abril. Ao todo, somando os dois últimos casos, são 24 ataques ocorridos em escolas de todo o país desde 2002, sendo que 11 deles, ou 45% do total, foram registrados desde agosto de 2022. O Estado campeão em registros é São Paulo, com 7 ataques no período.
De acordo com a pesquisadora do programa de Mestrado em Educação da Unicamp, Cleo Garcia, o modus operandi é sempre o mesmo. Adolescentes vulneráveis, que passam por algum tipo de sofrimento no ambiente escolar e encontram conforto no ambiente virtual. São nos fóruns que eles encontram outras pessoas que compartilham dos mesmos pensamentos e os cooptadores, que estimulam os ataques. De acordo com Garcia, nesses lugares circulam conteúdos que estimulam o culto às armas e discursos extremistas carregados de misoginia e preconceito contra minorias.
“As pessoas que fazem essa cooptação de jovens dentro desses ambientes estão atentas a essas falas, discursos de ódio e sofrimento por parte dos adolescentes que são levados para essas comunidades. E eles fazem um acolhimento muito eficiente, convidam os adolescentes a participarem de comunidades que cultuam esse tipo de crime, fazem viralizar conteúdos que vangloriam autores de ataques”, afirma a especialista.
Ainda segundo a pesquisadora, o ambiente eleitoral extremo vivido em 2022 e o retorno recente à normalidade pós-pandemia podem ter potencializado os ataques recentes.
“São muitos os fatores que levam a esse crescimento. Não podemos ignorar que nós estamos vindo de um período eleitoral de discursos extremos e de um adoecimento mental e social muito grande, em função da pandemia. Os adolescentes estão vindo de um período muito grande afastados das escolas e vivendo, basicamente, em ambientes virtuais, além de questões de violência dentro da própria casa. Então eles tiveram um acesso muito fácil a chats, fóruns, etc. Estamos falando aqui de adolescentes que já vinham de algum sofrimento dentro do próprio ambiente escolar, como bullyng, exclusão e que encontraram acolhimento em comunidades virtuais recheadas de discursos extremistas”, finaliza.
Imagem Ilustrativa/Marcelo Camargo/Agência Brasil
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