Por Fernando Rodrigues de Almeida
Ontem foi dia dos professores e talvez, de forma bem lúgubre o que a vontade imediata diria é: que tempo infeliz esse para ser professor. O tempo que há um discurso político querendo criminalizar essa profissão, acusar e desrespeitar baseado em conspirações moralistas; um tempo em que a informação é protagonista mas uma informação reprodutiva e sem paciência para a profundidade e sem tempo para o tempo que o aprender precisa; em um tempo que a educação se torna exercício de mercado e tem como consequência a sua relativização, o EaD, a apostila e os esquemas mentais; tempo em que os cursos de licenciatura veem seus bancos cada dia mais vazios segundo o desencanto que tudo isso provoca. Então resta a pergunta: para que seriamos professores?
Românticos responderiam que é por amor, mas esse conceito é tão raso quanto a narrativa de conformismo por trás dele, que impele que o professor se venda e se conforme com o status quo dos problemas apresentados antes. Então defendo o contrário, existe um porquê em ser professor, um porquê que não pode ser explicado por apostilas, esquemas ou narrativas, um porquê que não pode ser contestado por raivosos moralistas da política do caos e do ódio, um porquê que não pode ser medido na utilidade. Esse porque está em uma ideia a qual trabalhei aqui semana passada, que é a apatia, mas para fundamentá-la melhor, devemos pensar mais como os maltratados estoicos, pensar em grego: Ta eph’hemin, ta ouk eph’hemin – isso significa: o que está em nosso poder não está em nosso poder.
Eu escolhi ser professor, ainda que pudesse advogar, ou ter qualquer carreira jurídica que exigisse um bacharelado, escolhi não o fazer para poder estar totalmente focado nessa ideia de docência, e essa escolha foi uma ação deliberada e por ação temos um conceito que todos os verdadeiros professores entendem. A ação é um resultado, resultado de um misto de emoções, afecções e razão, mas por resultado é uma proposição que tem um objetivo, e por objetivo se tem como finalidade a concretização. Toda ação visa um resultado, por isso a razão pode virar medo, porque todos os efeitos dos sentidos dependem do resultado.
Porém, não há na docência ação que não alcance sua finalidade, o professor é um vitorioso em uma ação interminável. Aquilo que o professor faz não é útil, quem busca utilidade na educação não entende sobre o que se diz o ato. A educação é efervescência. O papel do professor é pela ação despertar aquilo que naquele que o escuto virá a ser ação, ele age diretamente na afecção do sentimento. Que causa tédio, que causa raiva, que cause inspiração, essa fundamentação não importa ao professor, este tem seu objetivo na provocação do sentimento, não há revolucionário sem sentimento de algo que não esteja em si mesmo, e o professor é esse produtor, do sentimento fora de si, da racionalização do sentir, na criação da disposição. O professor tem o poder de retirar de si o poder e entregar a um novo ator, aquele que vai agir da maneira que lhe convir, o professor é produtor de humanidade.
Mas quem é esse professor? É esse sujeito que dispensa sua própria ação de si pelo imposto de pela sua ação gerar ação no outro. Gerar ações sobre aquilo que mais humano é um sujeito, a crítica.
Professor não é neutralidade, professor é crítica. Professor não é gênio, é crítica. Professor não é técnico, é crítica. Do contrário não temos um professor, temos um resumidor de conteúdo. Professor é o detentor da ação. Aquele que tem o poder de não estar em seu poder. Por isso vive assim, diferente do que pensam, ele não é um romântico, não vive em abstinência, ao contrário, sua aphateia é o fato de agir para a ação daquele que é afetado, aqueles, inúmeros, que todos os dias sentam, gostem ou não, para ouvi-lo agir.
Imagem: Freepik / Foto criada por @stockking
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