No mês do Orgulho LGBTQIA+, em vez de comemorar, nós celebramos – a nossa vivência, sobrevivência, direitos conquistados e os que ainda virão e mais: nossa existência.
Estamos em junho, o mês oficial da celebração do Orgulho LGBTQIA+. Foi neste mês que, em 1969, no dia 28 de junho, o movimento LGBTQIA+ foi marcado por uma lembrança truculenta, porém importante: a invasão ao bar Stonewall Inn, no bairro de Greenwich, em uma Nova York acostumada a presenciar ações policiais de invasão à locais públicos, como o bar – sobretudo por estar cheio de representatividade lá dentro. Sylvia Rivera e Marsha P. Johnson, inclusive, estavam lá. Sylvia, por sua vez, é uma referência e em um trecho de entrevista que forneceu em 1989, já introduz o que eu quero falar um pouco mais pra baixo, neste texto:
“Antes dos direitos dos homossexuais, antes do Stonewall, eu estava envolvida no movimento de libertação negra, o movimento pela paz (…) Eu senti que tinha tempo e sabia que tinha que fazer algo. Meu sangue revolucionário estava voltando naquela época. Eu estava envolvida nisso”, disse ela numa entrevista em 1989, conforme a Vogue.
De lá para cá, muito foi feito: direitos foram conquistados, marchas foram postas na rua, paradas do Orgulho LGBTQIA+ são organizadas ao redor do mundo – com São Paulo na rota das maiores organizações do evento no mundo inteiro. Mas, ainda assim, vemos o Brasil figurar entre os países que mais matam pessoas da comunidade no mundo. Ainda mais quando se trata da letra T, na sigla: 175 travestis e pessoas trans foram mortas no Brasil só em 2020. E qual a razão?
Muitas pessoas LGBTQIA+ vivenciam mais de uma luta, dentro e fora da comunidade. Existe o preconceito externo e interno, que desvalida e desconsidera, que enfraquece e prejudica a luta pelos direitos fundamentais.
A vivência de uma pessoa LGBTI+ preta, não é a mesma de uma pessoa LGBTI+ branca.
A vivência de uma pessoa LGBTI+ gorda, não é a mesma de uma pessoa LGBTI+ não gorda.
A vivência de uma pessoa LGBTI+ trans, não é a mesma de uma pessoa LGBTI+ cis.
São tantos os recortes sociais que são difíceis de serem todos narrados, mas que apontam que ainda vivemos em uma sociedade machista, gordofobica, racista, capacitista, xenofóbica e com tantos outros horrores. Ou seja: é impossível falar sobre representatividade LGBTQIA+ sem olhar para os recortes de classe, raça, gênero e orientação sexual.
Mas agora eu quero falar um pouquinho mais sobre o título deste texto. E por mais que escrever esta coluna, dentro de um jornal onde uma grande parcela da população têm acesso, é uma forma de falar por mim mesmo (e pelos meus semelhantes) sobre nossa história. Eu me orgulho em poder contar a nossa história por aqui. A cada texto, eu tenho a certeza que estou conversando com diversas pessoas que estão me lendo e, ainda mais, entendendo um pouco mais do nosso universo. Mas, se me permitem, eu adoraria perguntar algumas coisas aqui:
- Com quantas travestis você já conversou?
- Você sabe da história do seu amigo LGBTQIA+, desde quando ele se descobriu, até hoje?
- Você já se perguntou o porquê de a TV e o entretenimento projetarem sempre uma imagem caricata da comunidade?
- Por que todos os gays são engraçados e afeminados, todas as lésbicas são masculinizadas e caricatas, toda travesti é garota de programa e todo bissexual é indeciso?
- Você está nos ouvindo através da boca de quem vive ou de quem acha que sabe sobre nossa vivência?
Caso suas respostas tenham sido majoritariamente negativas, é legal olhar o motivo disso. Por que não? Por que nunca? Não é hora de começar a mudar esse cenário?
Hoje, meu trabalho e fonte de renda vêm do trabalho no ramo da publicidade. Sou jornalista de formação, mas atuo diretamente em estratégias de marketing para e-commerces – e, por isso, eu vou aproveitar esse espaço de hoje para falar um pouco também sobre mercado de trabalho x diversidade e inclusão no ambiente de trabalho. Como é possível que empresas apoiem a diversidade, de verdade?
O primeiro passo é reconhecer como o negócio pode celebrar a diversidade. E isso vai muito além de produzir, vender ou fornecer produtos com a temática, mas sim, aliar-se realmente à causa. Na cidade onde sua empresa está inserida, há assistência social para pessoas da comunidade LGBTQIA+? Como é possível atuar em parceria definitiva nesta promoção?
Internamente, há colaboradores e colaboradores da comunidade? A empresa emprega pessoas trans/travestis? Se sim, essa pessoa é incluída na sua totalidade, respeitada e tratada por quem ela representa no coletivo empresarial?
Muito mais do que fabricar produtos que movimentem a economia de pessoas da comunidade, promover um ambiente de trabalho seguro para a comunidade é extremamente importante, pois é no trabalho que as pessoas passam 8 das 24h do seu dia.
Hoje é 28 de junho. E um dos meus principais desejos é que nós possamos falar abertamente e sermos ouvidos quando quisermos contar as nossas histórias. Quando quisermos mesmo, não só quando pudermos, pois usar o termo “poder”, no sentido de autorização, dá a entender que só poderíamos falar sobre nossas vivências quando tivermos autorização. E, se precisamos de autorização, podemos supor de que dependemos de autorização de algo ou alguém para isso. Mas, da nossa história, quem sabe é a gente.
Que nossa bandeira nunca deixe de ser do amor, do respeito, da conquista e luta por direitos e pela existência: de cada um e do coletivo.
Feliz 28 de junho.
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