A lenda por trás da possível passagem de Che Guevara por Maringá

Revolucionário marxista e um dos líderes da Revolução Cubana, Ernesto Guevara de la Serna esteve no Brasil em 1961, para receber uma honraria do então presidente Jânio Quadros. Daí, lendas urbanas dariam conta de que ‘Che’ pernoitou em um hotel na região central da Cidade Canção. Historiador relata o que há de mito e o que é verdade sobre o assunto.

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    Uma das figuras mundiais mais conhecidas no século XX, Ernesto Guevara de la Serna, ou popularmente ‘Che’ Guevara, foi um dos principais líderes da Revolução Cubana, movimento armado ocorrido em 1959 que derrubou a ditadura do então general Fulgencio Batista em Cuba, levando ao poder um governo socialista na ilha caribenha.

    Contrapondo ao modelo econômico capitalista que era predominante mundialmente, a chegada de Guevara e aliados ao poder, como Fidel Castro, provocou tensões com os Estados Unidos, algo que forçou os revolucionários em, muitos momentos, precisarem circular pela América do Sul na base da clandestinidade.

    Uma das poucas visitas dele à América do Sul em caráter oficial ocorreu em 1961 e teve como destino o Brasil, onde Che foi agraciado com a ordem da Cruzeiro do Sul, uma das principais honrarias brasileiras pelo então presidente Jânio Quadros, fato que posteriormente abalou o próprio governo, acusado por opositores de se aliar a comunistas.

    Logo após a homenagem, Che Guevara teria buscado uma rota de motocicleta para chegar até a Argentina e, de lá, buscar um meio de retornar ao Caribe, fato expresso em algumas de suas biografias. No entanto, uma lenda urbana se originou desta história, dando conta de que, no caminho até a Argentina, o guerrilheiro tenha passado e pernoitado em Maringá.

    Quando as lendas surgiram, havia até o hotel onde o revolucionário teria se hospedado: o Hotel Vila Rica, na rua Joubert de Carvalho e em atividade até os dias atuais. Mas o que é mito e o que é verdade nesta história? Teria um dos principais líderes da Revolução Cubana passado pela Cidade Canção?

    Para tentar desvendar esse mistério, o Maringá Post entrevistou o historiador Miguel Fernando, idealizador do projeto ‘Maringá Histórica‘ e que investigou pessoalmente o assunto.

    A investigação contou com uma visita até o próprio hotel, em busca de registros de hóspedes da década de 1960. Conforme Miguel, não é possível cravar que o revolucionário esteve na cidade com os indícios atuais, ao menos no período da homenagem recebida do governo brasileiro em 1961. Para o historiador, se Guevara passou pelo norte do Paraná, teria sido em outra ocasião.

    “É uma narrativa que acabou sendo construída em torno dessa e outras situações envolvendo o Jânio e depois do Jango, o João Goulart. Eu cheguei a visitar o hotel Vila Rica para tentar buscar por um registro de hóspedes, para ver se eles tinham algum tipo de registro da década de 1960 e tentar mapear se existia alguma possibilidade. Provavelmente, se ele passou por aqui, ele não passou em caráter oficial porque, segundo a biografia do Che Guevara, ou algumas biografias vão se dizer, por meio de algumas documentações, diários e tudo mais, que ele teria passado em outra oportunidade, saindo da Argentina, cruzando o Noroeste e o Norte do Paraná e entrando no Estado de São Paulo de maneira clandestina. Então, é bem provável que, se ele passou, não foi em 1961, quando ele esteve no Brasil, porque ele veio em caráter oficial para receber uma homenagem. E, quando supostamente ele teria passado por aqui, teria sido de forma clandestina e, por essa razão, a gente não teria como encontrar o nome dele registrado como hóspede”, afirmou.

    O hotel Vila Rica, onde Guevara teria se hospedado na cidade, não guarda registros de hóspedes da década de 1960. Ainda conforme Miguel, se a visita do guerrilheiro a Cidade Canção ocorreu posteriormente, não teria sido com interesses políticos.

    Ele argumenta sobre movimentos de esquerda que eram bem atuantes em Maringá na década de 1960. Logo, se Ernesto tivesse presente em algum desses eventos, haveria algum registro oficial.

    “Em 1961, por exemplo, acontece aqui o Segundo Congresso dos Trabalhadores Rurais, onde a gente vai ter a presença do Francisco Julião, que era um líder, um coordenador das ligas camponesas do Nordeste Brasileiro. Foi daí que surgiram boatos na imprensa de que Che Guevara também estaria na cidade. Certamente ele teria se deixado fotografar, como outras autoridades assim o fizeram. E seria numa conjuntura que faria mais sentido, porque naquele ano ele foi reconhecido pelo governo brasileiro com a honraria”, explicou.

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