“Eu me senti bem humilhada, muito mal. Eu não estava ali fazendo nenhuma piada”, lembra a estudante Caroline Ferreira da Silva. Ela é uma mulher trans, aluna do curso de Filosofia, que conta ter sido vítima de atitudes transfóbicas durante o debate das eleições do DCE, o Diretório Central dos Estudantes da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
A queixa tem relação com o momento em que Carolina levantou para fazer uma pergunta durante o debate das três chapas concorrentes ao DCE na quarta-feira (23/10). Os cochichos e deboches teriam começado depois que a mediadora do debate apresentou a estudante com o nome social.
“Quando eu levantei, todos eles que estavam agrupados na direita do auditório e começaram a dar risadas e cochichar. Eu não consegui ouvir direito o que falavam, eu estava muito nervosa e me sentindo muito mal”, contou a jovem.
Ela conseguiu fazer a pergunta sobre cotas raciais com o apoio do resto de auditório. Embora se sinta vítima de transfobia, disse que não tem a intenção de fazer uma denúncia formal na Polícia Civil. De acordo com a estudante e outros alunos presentes, as atitudes transfóbicas teriam partido de membros da Chapa 1 – Acelera UEM.
A reportagem do Maringá Post tentou contato com os representantes da Chapa 1, mas até o momento não obteve retorno.
Procurada, a Comissão Eleitoral do DCE disse que a situação passa por análise e que não vai se pronunciar sobre o caso até que uma decisão seja tomada. As eleições no DCE da UEM vão ser realizadas no dia 21 de novembro.
A Chapa 2 – Uem Popular, concorrente, se manifestou nesta segunda-feira (28/10) por meio de nota de repúdio. Eles criticam os supostos comportamentos transfóbicos, mas não acusam diretamente a chapa concorrente.
Durante o debate, a polêmica ganhou mais força após as respostas à pergunta de Carolina. A chapa 2 e a Chapa 3 – A UEM não vai embora, que também disputa as eleições do DCE, se posicionaram favoráveis às cotas raciais.
A chapa 1 não se posicionou nem contra nem a favor. Os representantes responderam que caso ganhassem a eleição, fariam plebiscitos com os representantes, já que a chapa é formada por pessoas de várias ideologias e todas deveriam se posicionar sobre o assunto.
Segundo alguns presentes, o clima esquentou quando estudantes negros tentaram se posicionar contra a reposta da chapa 1. Houve discussões acaloradas entre as chapas e o público presente. A comissão eleitoral precisou encerrar o debate para evitar o risco de violência física no local.
Veja a nota de repúdio divulgada pela chapa 2
“A chapa 2 – UEM Popular concorrendo ao pleito do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Estadual de Maringá vem a público repudiar atos opressivos que ocorreram no primeiro debate entre as chapas concorrentes a gestão 2019/2020.
Durante o transcorrer do debate, pudemos perceber que os ânimos exaltados acabaram por estimular um ambiente de tensão e de violência, refletidos nas palavras e comportamentos de alguns presentes. Repudiamos toda e qualquer manifestação de transfobia ocorrida durante a manifestação de uma mulher trans, assim como repudiamos a tentativa de silenciamento de uma mulher cis no decorrer da sessão de perguntas do público, sendo necessária intervenção da mediadora do debate.
Repudiamos também atos e comportamentos que culminaram em discussão e violência verbal que não se transformou em violência física porque houve contenção pela comissão eleitoral e pelos demais presentes.
Estes fatos demonstram que apesar de se debater a pauta das opressões na universidade, ainda há um longo caminho para que seja incorporado em nossos comportamentos e atitudes o respeito a qualquer ser humano, independente de classe, gênero, cor e sexualidade.
Ressaltamos que a defesa das cotas raciais é fundamental na nossa universidade como medida de reparação social a essa parcela da população, como forma paliativa de diminuir a desigualdade social existente entre brancos e negros na sociedade brasileira. Sendo assim, consideramos o posicionamento político contrário às cotas raciais como um posicionamento racista, pois legitima o racismo estrutural, refletido na dificuldade de acesso à universidade pela população negra.
Em reunião da chapa 2 – UEM popular, não foi declarada, por parte de nenhum presente, nenhuma prova material e/ou concreta de crime de racismo ou de injúria racial durante o debate, referente, respectivamente, ao artigo 20 da lei 7716/89 e/ou ao artigo 140 3° parágrafo do código penal, no entanto, não significa que não possa ter ocorrido.
Repudiamos, portanto, todo e qualquer pronunciamento, atitude, comportamento ou postagem em redes sociais com provocações e que incitam a violência a qualquer pessoa e esperamos que no próximo debate não ocorra tais atitudes, respeitando assim todos e todas presentes, garantindo um debate de ideias e propostas, sem provocações e sem incitação à violência.
Ressaltamos que estimular um ambiente de tensão e de violência entre os estudantes não ajuda em nada na efetivação das propostas que as chapas têm para o diretório central dos estudantes (DCE) da UEM e, que independente do resultado das eleições, precisamos buscar, ainda que seja difícil, a unidade entre os estudantes frente aos ataques massivos dos governos federal e estadual à educação pública, ataques estes que afetam principalmente os grupos sociais mais explorados e excluídos, como no caso da população negra e da comunidade LGBT.
Por fim, queremos destacar nossa solidariedade àqueles e àquelas que se sentiram ofendidos e constrangidos por parte de alguns presentes no debate.”
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