Só 10% dos resíduos vai para reciclagem em Maringá. Sem estrutura, cooperativas não acompanham crescimento da coleta seletiva

  • Apesar de algumas mudanças no sistema de coleta seletiva a partir de 2017, como a terceirização de caminhões e a distribuição de sacolas plásticas para esse tipo de material, menos de 10% de todo o resíduo sólido vai realmente para a reciclagem em Maringá.

    Atualmente, na média mensal são coletadas 9.450 toneladas de resíduos sólidos na cidade. Excluindo cerca de 600 t a 700 t que ficam com as cooperativas de reciclagem, todo o resto vai para o aterro sanitário, deixando de contribuir com a preservação ambiental e gerar renda.

    Em outubro Maringá mandou para as cooperativas 670 t de recicláveis. O recorde foi em julho, com 770 t, mas dessa quantidade, cerca de 10% ainda se torna rejeito porque não pode ser utilizado. Restos de leite nas caixinhas longa vida do produto, por exemplo, inviabilizam a reciclagem.

    Para o especialista em direito ambiental e ex-assessor da Associação de Reciclagem Popular e Solidária de Maringá (ARPSOL), Marcos Bento Veshagem, a chamada “Cidade Verde” ainda tem um longo caminho a percorrer para fazer justiça a um conceito mais amplo do título.

    Em artigo publicado por Marcos como trabalho de conclusão de uma especialização feita na Universidade de Coimbra, em Portugal, ele aponta uma lista de pontos que precisam ser revistos em Maringá quando o assunto é reciclagem e práticas ambientais.

    Ele aponta, como exemplos, os altos custos de manutenção da empresa terceirizada que administra o aterro sanitário e o modelo misto de coleta seletiva. A prefeitura faz a coleta de recicláveis com cinco caminhões próprios e dez terceirizados. O contrato com a terceirizada é de R$ 5,7 milhões.

    Já o aterro custou R$ 10,2 milhões. Há ainda os custos dos sacos biodegradáveis, que saíram por R$ 367,5 mil. “Acredito que o Município poderia economizar administrando ele próprio esses serviços, por exemplo, com a compra gradual de caminhões”, diz Marcos.

    O fato é que os 15 caminhões não são suficientes para a coleta seletiva da cidade. A diretora de Cooperativas de Reciclagem da Secretaria Municipal de Serviços Público (Semusp), Aline Gava, confirma que hoje é impossível aumentar o percentual de lixo que vai para o reaproveitamento.

    “Em 2018 a coleta foi aumentando principalmente por causa da distribuição dos sacos de lixo, mas ainda não há como promover um aumento maior”, diz Aline, justificando a falta de campanhas de conscientização da população, outro ponto apontado como falho pelo artigo de Marcos.

    O trabalho de preparar os moradores para fazerem a separação correta do lixo está prevista no Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos municipal, atendendo à lei nacional, mas segundo Aline, Maringá não tem hoje estrutura de caminhões e cooperativas para acolher mais recicláveis.

    Para Marcos, é justamente nas cooperativas que está um dos maiores problemas. “Elas não têm estrutura suficiente e adequada, nem uma gestão eficiente”, afirma. A cidade tem atualmente 150 cooperados que se dividem em sete organizações.

    As cooperativas são responsáveis por separar e vender o que é coletado. O lucro das organizações vem dessas vendas e também de valores repassados pelo município. A prefeitura paga às cooperativas R$ 203,99 por tonelada que chega aos barracões.

    No último ano foram repassados mais de R$ 1,3 milhão. Dividindo esse valor entre os 150 cooperados, seria cerca de R$ 747 por mês para cada um. A diretora financeira da Coopernorte, Sheila Alves Matos, diz que o que chega da prefeitura paga no máximo as despesas administrativas da instituição.

    A Coopernorte está com 24 cooperados e recebeu, em 2017,  R$ 176.195,52. Sheila conta que com a venda dos recicláveis a empresa tem conseguido pagar a cada membro cerca de R$ 1,5 mil por mês. Ela comemora o resultado, mas diz que falta estrutura para a cooperativa crescer.

    “Estamos preparados para receber 72 toneladas de material por mês, mas estamos recebendo cerca de 170. Temos cooperados trabalhando debaixo de árvores porque sob o barracão não cabe mais”, relata.

    Sheila diz que quer ver o trabalho aumentar, mas cobra melhorias nas cooperativas que já existem. Mão de obra ela garante que não vai faltar, pois tem uma lista de 62 pessoas esperando para fazer parte da empresa.

    Por causa do crescimento da coleta seletiva, a prefeitura está realizando a capacitação e contratação de novos cooperados. Tanto para Marcos quanto para Sheila, essa não é a forma mais adequada de resolver a questão. “Nós precisamos de espaço e bons barracões para as cooperativas que já existem. Sou contra a criação de novas cooperativas”, diz Sheila.

    Para o especialista Marcos, novas cooperativas não resolvem. “Trabalhar com as questões ambientais e a formação de grupos é uma forma de justiça social para os catadores, que antes da existência do aterro, trabalhavam no lixão. O que eles precisam é de estrutura, pois nos barracões, que são responsabilidade do município, há precariedades de todo o tipo”, conclui.

    Questionada sobre essa questão, a diretoria municipal de cooperativas disse que a prefeitura está cumprindo o que está definido no Plano de Gerenciamento e que está em fase de licitação para o aluguel de um novo barracão.

    Título não é para comemoração

    Em 2017, Maringá foi condecorada pelo Índice de Sustentabilidade de Limpeza Urbana, o ISLU, como o melhor município com mais de 250 mil habitantes em termos de sustentabilidade, limpeza e cumprimento de medidas impostas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos.

    Para Marcos Veshagem, essa é uma vitória que não pode ser comemorada. Ele questiona até mesmo os critérios utilizados pelo ISLU que, como próprio índice diz, o objetivo não é o de eleger o modelo mais eficiente de limpeza urbana, mas sim, avaliar o cumprimento da lei.

    O ISLU leva em consideração quatro indicadores: engajamento do município, sustentabilidade financeira, recuperação dos recursos coletados e impacto ambiental.

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