Projeto do Conselho da Comunidade de Maringá busca penas alternativas para quem dirige alcoolizado. Em três anos, foram atendidas 274 pessoas

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O consumo excessivo de álcool está relacionado a 3,3 milhões de mortes por ano no mundo. E os acidentes de trânsito matam 1,25 milhão de pessoas. Isso quer dizer que quando você terminar de ler este texto, pelo menos duas pessoas terão morrido vítimas de um acidente com veículo. As informações são da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Que a combinação álcool e direção é trágica todos sabem. O desafio é reduzir o número de acidentes por embriaguez ao volante por meio de educação, conscientização e tratamento. É esse o objetivo do Projeto Justiça e Sobriedade no Trânsito do Conselho da Comunidade de Execuções Penais da Comarca de Maringá, que em três anos atendeu 274 pessoas.

O Conselho da Comunidade busca penas alternativas para quem dirige alcoolizado e atua em conjunto com órgãos do judiciário para aproximar a participação da sociedade na execução penal. Ao ser presa dirigindo alcoolizada, a pessoa passa por uma audiência para conhecer o projeto. Se aceitar participar do programa, o processo penal é suspenso e o infrator não responderá criminalmente. .

Para tanto, são impostas algumas condições. Na primeira etapa do Projeto Justiça e Sobriedade do Trânsito, o infrator é encaminhado para o Conselho da Comunidade e depois deve passar por um ciclo de palestras com profissionais da Polícia Militar, SAMU, Detran e outros órgãos afins.

Depois, ele terá que cumprir 30 horas de prestação de serviço à comunidade em um hospital ou outro estabelecimento de saúde e passar por uma sessão nos Alcoólicos Anônimos. Também passará por atendimento com residentes de psicologia da Universidade Estadual de Maringá e deverá comparecer a cada três meses na Vara de Execução Penal e Medidas Alternativas. Além disso, não poderá cometer nenhuma infração por dois anos.

Nestes três anos do projeto, o Conselho atendeu 274 pessoas, sendo que 221 passaram pelo ciclo de palestras e 169 cumpriram o primeiro procedimento do programa. Atualmente, 62 pessoas estão cumprindo a medida e 43 descumpriram os requisitos do projeto e voltarão a responder o processo criminalmente.

O Projeto Justiça e Sobriedade no Trânsito também atende motoristas alcoolizados que feriram alguém no trânsito. Porém, quando o caso envolve homicídio, a pessoa responderá criminalmente pelo ato e o projeto terá apenas cunho educativo. Nos três anos do projeto, o Conselho da Comunidade de Maringá acompanhou três casos como este.

Trabalho social pode ser mais eficaz que outras penas

Para a assistente social do Conselho da Comunidade de Maringá, Franciele Holanda de Moura, o projeto é mais eficaz do que as penalidades previstas no Código de Trânsito. As penas para quem dirige alcoolizado previstas no Artigo 306 do código podem ser detenção de um mês a três anos, multa e suspensão ou proibição de obter a habilitação.

“O projeto prevê a prevenção, o cuidado com a saúde das pessoas autuadas e a proteção de toda a sociedade. O Projeto Justiça e Sobriedade no Trânsito é considerado um redutor de danos, diante de sua prevenção frente ao uso de bebidas alcoólicas e direção”, diz Franciele.

A assistente social conta que nos três anos do projeto em Maringá, atendeu pessoas que nunca passaram por atendimento médico e não se preocupavam com a saúde.

Segundo ela, a parte mais importante do programa é quando os motoristas cumprem a medida em um ambiente relacionado a saúde e estão em contato com pessoas que sofreram acidentes que podem estar relacionados a embriaguez. “Aí sim, acreditamos nas possibilidades de mudanças e conscientização dessas pessoas que estão em cumprimento da medida.”

De acordo com o Departamento Estadual de Trânsito (Detran), no primeiro semestre do ano passado, 5.089 motoristas foram flagrados dirigindo alcoolizados no Paraná. Aumento de 44,9% em comparação com o mesmo período de 2016 quando foram registradas 3.512 infrações por esse motivo.

O projeto Justiça e Sobriedade no Trânsito surgiu em São José dos Pinhais e busca efetivar as penalidades do Código de Trânsito e ao mesmo tempo a conscientização e os cuidados na área psicológica e saúde sobre o uso excessivo do álcool. Franciele diz que essas são as únicas saídas, já que o álcool e as drogas nunca deixarão de existir.

“O aumento de violência referente ao uso de álcool e direção é muito grande no Brasil e em Maringá vem aumentando significativamente. Observa-se que existe uma cultura que enaltece constantemente o uso de bebidas alcoólicas. Constata essa exaltação nas propagandas, nos bares, nas festas e baladas. Para uma pessoa ser aceita num determinado grupo social, ela necessita fazer o uso de alguma bebida alcoólica.”

Conheça mais sobre o Conselho da Comunidade

Instituído na Lei de Execução Penal, o Conselho da Comunidade de Maringá promove a participação da sociedade na execução da pena e auxilia o Poder Judiciário e o Ministério Público. Para Franciele, o Conselho tem a função de representar a comunidade.

“É necessário assumir uma função política, de defesa de direitos, de articulação e de participação nas forças locais pela construção de estratégias de reinserção do apenado e do egresso e não apenas uma função assistencial. Sempre atuando, em parceria com outras instâncias, pela humanização das políticas públicas sociais e penais”,  afirma a psicóloga.

O Conselho da Comunidade de Maringá foi implantado em 1998 pelo então Juiz da Vara de Execuções Penais, Nabor Hishikawa. Atualmente o Conselho desenvolve e acompanha seis projetos que vão desde empoderamento das mulheres privadas de liberdade, a inserção do preso em cursos profissionalizantes e o Projeto Justiça e Sobriedade no Trânsito.

Confira cada um dos projetos do Conselho

  • Projeto Maria Bonita: Empoderamento das Mulheres cercadas pela violência do cárcere. O projeto atende familiares das pessoas privadas de liberdade da comarca de Maringá.
  • Projeto Portas Abertas: A educação como caminho para a profissionalização. O projeto visa a inserção do preso à um curso profissionalizante para a colação dele no mercado de trabalho.
  • Projeto GDUCC – Grupo de Diálogo Universidade, Cárcere e Comunidade: Um Projeto de Extensão sob a coordenação o departamento de Direito da Universidade Estadual de Maringá (UEM). A função do Conselho da Comunidade de Maringá é acompanhar os estudantes a comunidade no diálogo junto as pessoas privadas de liberdade. O projeto é desenvolvido na Penitência Estadual de Maringá (PEM), Casa de Custódia de Maringá (CCM) e na Carceragem da 9ª Subdivisão Policial de Maringá.
  • Projeto Venda de Artesanatos: Promove a venda de produtos confeccionados em crochê por pessoas privadas de liberdade, tendo por objetivo a promoção e a geração de renda e trabalho.
  • Projeto Justiça pela Paz em Casa: O objetivo é prevenir a violência contra mulheres. O projeto conta com a parceria da Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar.
  • Projeto Justiça e Sobriedade no Trânsito: Visa o acompanhamento frente a medida de pessoas autuadas pela Polícia Militar por embriaguez no volante.

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