Quem passa pela Rua Fernão Dias, na zona 9, a qualquer hora do dia, encontra vários moradores de rua deitados nas calçadas. A concentração, que irrita comerciantes e trabalhadores de empresas próximas ao local, se deve à localização do Albergue Santa Luiza de Marillac e do Centro Pop, que dão apoio a quem vive ao relento.
“A principal necessidade que tem é a alimentação. Então ficam por ali, fazem o que quiser e, quando dá fome, sentem a segurança de estar próximos a estes locais”, avalia a coordenadora do Observatório das Metrópoles de Maringá, Ana Lúcia Rodrigues, que prepara o relatório final sobre a terceira pesquisa feita com moradores de rua na cidade.
O Observatório contou 177 moradores de rua, em Maringá, número bem superior aos 117 encontrados em 2016 e bem próximo dos 160 entrevistados em 2015.
“No ano passado, fizemos a pesquisa no começo de novembro, logo após o segundo turno das eleições. E percebemos que houve um movimento, durante a campanha, de remoção. No Portal da Transparência aparecem muitas passagens de ônibus concedidas pela Secretaria de Assistência Social (Sasc) neste período”, analisa.
Entre os 177 moradores de rua, foram encontrados cinco pessoas que chegaram a concluir o ensino superior. “Encontramos pessoas que são administradores e até um dentista. É incrível, mas tem. Apesar do ensino, o cidadão teve uma degradação tão grande na vida que acabou na rua”, lamenta.
A média de idade destes moradores é de 39 anos e apenas 7,4% são mulheres. A pesquisa mostra que 86,9% têm profissão, metade já sofreu violência física e a grande maioria é usuária de bebidas alcoólicas (150), crack (101) e maconha (110).
“Agora vamos cruzar dados sobre escolaridade com outros elementos para ver se há relação, por exemplo, entre casos de maior escolaridade e uso de crack também, ou se o problema maior é o vício no álcool”, afirma.
Nove de cada dez moradores de rua querem uma chance
De todos os moradores de rua entrevistados pelo Observatório das Metrópoles, 92,9% afirmam que gostariam de sair das ruas. Para isto, colocam como necessidade básica um emprego e moradia.
“Estas são as grandes políticas públicas que precisam estar associadas, além do tratamento de saúde. A única forma de resolver é com ações que deem condições, continuidade e acompanhamento. É preciso aportar muito dinheiro público. Se não, não adianta”, diz.
A professora relata que o aumento dos moradores de rua tem relação direta com a crise. “O principal motivo para a pessoa ir morar na rua é a dependência química, mas este ano aumentou o percentual relacionado ao desemprego e ao rompimento familiar, que são questões relacionadas à crise”, afirma.
Quando a pessoa perde o emprego e há um rompimento familiar, normalmente é a mãe que fica com os filhos “e os homens vão para a rua porque não têm condições de manter uma outra casa”, aponta.
O relatório final da pesquisa será encaminhado ao Ministério Público, à Sasc e a um Comitê Intersetorial em fase de consolidação na cidade.
Para Ana Lúcia, um dos aspectos mais marcantes do trabalho foi a frase que ouviu de um dos entrevistados. “Professora, pior do que viver na rua é só a morte. É uma frase que simboliza muito a condição de estar na rua. É terrível, inseguro, eles ficam com medo o tempo todo”, diz.
A pesquisa mostra que, à exceção do medo de apanhar de policiais, o maior receio de quem mora na rua é apanhar de outra pessoa que vive nas mesmas condições.
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